Encontro foi ponto de partida de plano para matar o presidente Lula, o vice, Geraldo Alckmin, e o ministro Alexandre de Moraes, do STF
Patrik Camporez e Eduardo Gonçalves - O Globo
O ex-ajudante de ordens Mauro Cid confirmou, em depoimento prestado ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a realização de uma reunião na casa do ex-ministro da Defesa Walter Braga Netto para tramar um golpe de Estado. Segundo relatório da PF, o apartamento do general do Exército foi usado para uma reunião no dia 12 de novembro de 2022.
O encontro, segundo a investigação, é o ponto de partida do plano que previa o assassinato do então presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, do vice eleito, Geraldo Alckmin, e do ministro Alexandre do Moraes, do STF, que à época também presidia o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Foi no endereço do militar, na Asa Sul de Brasília, onde "o planejamento operacional para a atuação dos 'kids pretos' foi apresentado e aprovado". Braga Netto consta como um dos indiciados no inquérito do golpe.
Mensagens trocadas via aplicativos de celular interceptadas pela PF apontam, dois dias após a reunião, os militares suspeitos de participar da trama golpista passaram então a discutir providências para colocar o plano em prática e monitorar o deslocamento de autoridades. Em uma delas, por exemplo, o então assessor especial da Presidência Marcelo Câmara descreve para Cid qual seria a rota utilizada por Moraes para participar da diplomação de Lula, em 12 de dezembro.
No depoimento de mais de duas horas, Cid foi questionado sobre o plano para matar autoridades, investigado pela PF, mas voltou a negar participação. Em depoimento prestado na sede da corporação na terça-feira, o tenente-coronel já havia afirmado desconhecer um plano golpista que incluia os assassinatos.
Sobre Braga Netto, Cid detalhou toda a reunião, e confirmou as descobertas feitas pela PF que implicam diretamente o general nos planos golpistas. O general foi ministro da Casa Civil e da Defesa durante o governo Bolsonaro e deixou o posto para se candidatar a vice na chapa do ex-presidente, em 2022.
Em momentos anteriores da investigação, a PF também o apontou como elo entre Bolsonaro e integrantes dos acampamentos que pediam intervenção militar e autor de mensagens com xingamentos e ofensas a integrantes da cúpula das Forças Armadas que não aderiram aos planos de golpe de Estado.
De acordo com a delação de Cid à PF, Braga Netto costumava atualizar Bolsonaro sobre o andamento das manifestações golpistas e fazia um elo entre o ex-presidente e integrantes dos acampamentos antidemocráticos. A defesa do ex-ministro afirmou que não iria comentar, pois ainda não teve acesso às investigações.
Outro elemento apontado pela PF como indicativo da tentativa de golpe é um documento que prevê a criação de um "Gabinete Institucional de Gestão da Crise", que seria ativado a partir do dia 16 de dezembro, ou seja, um dia depois da data escolhida para a captura de Moraes. A minuta, que inclui o brasão da República e um aviso de "secreto", previa o general Augusto Heleno, então ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), como chefe. Braga Netto, pelo organograma, seria o "coordenador-geral". As defesas dos dois informaram que não iriam comentar.
Delação mantida
Moraes decidiu manter a validade do acordo de colaboração premiada firmado por Cid e a PF após ouvir o ex-ajudante de ordens na tarde desta quinta-feira.
"Após três horas de audiência, o ministro Alexandre de Moraes confirmou a validade da colaboração premiada de Mauro Cid. O ministro considerou que o colaborador esclareceu as omissões e contradições apontadas pela Polícia Federal. As informações do colaborador seguem sob apuração das autoridades competentes", informou o gabinete de Moraes.
O advogado de Cid, Cézar Bittencourt, disse ao sair da audiência que "tudo continua como antes":
— Ele deu satisfações e complementações. Não havia omissões.
A PF havia identificado contradições e omissões do militar nos depoimentos, o que poderia ferir as cláusulas do acordo.
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