Tarcísio faz ofensiva na Alesp para evitar derrota em projeto de anistia a multas que beneficia Bolsonaro

Uma das principais resistências está na federação PSDB/Cidadania, dona da terceira maior bancada da assembleia, com 12 deputados

Tarcísio de Freitas

Bianca Gomes e Guilherme Caetano - O Globo

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, tem feito uma ofensiva para convencer deputados da Assembleia Legislativa (Alesp) a aprovar o projeto que concede anistia a quem foi multado por descumprir medidas sanitárias na pandemia, como o uso de máscaras.

O projeto prevê que o estado abra mão de arrecadar cerca de R$ 72 milhões e pode beneficiar Jair Bolsonaro. O ex-presidente acumula cerca de R$ 1 milhão em dívidas por não ter usado máscaras em terras paulistas, multas que foram aplicadas pela gestão do ex-governador João Doria.

No texto de sua autoria, o governo Tarcísio argumenta que “a manutenção das penalidades aplicadas em decorrência de obrigações impostas para a prevenção e enfrentamento da pandemia de Covid-19 não mais condiz com o fim dos estados emergenciais de saúde pública e acaba por sobrecarregar a administração com o gerenciamento de processos administrativos e de cobranças de multas sem finalidade arrecadatória”. E que, “além de gerar um alto custo de processamento de milhares de débitos (a maioria de pequeno valor), a manutenção da cobrança das multas também não contribui para o desenvolvimento social e econômico do Estado”.

O artigo 36 do projeto de lei, que determina o cancelamento das multas aplicadas em razão do descumprimento de medidas sanitárias na pandemia, deve ser votado em separado em sessão na terça-feira que vem.

A separação do trecho foi uma solução da base para garantir a aprovação do projeto de lei de qualquer forma, já que a anistia às multas enfrenta forte resistência da oposição. O PT tentou suprimir o trecho para garantir voto favorável ao projeto, mas foi derrotado. Bolsonaristas se irritaram com o movimento, que cria um constrangimento para quem votar favoravelmente à anistia.

No dia em que o PL foi enviado à Alesp, Bolsonaro informou, por meio de auxiliares, que depositou em juízo o valor devido. No entanto, o nome do ex-mandatário segue inscrito na Dívida Ativa. Questionada pelo GLOBO, a Secretaria de Saúde disse que “os débitos inscritos ainda na esfera administrativa foram quitados e aqueles objeto de execução fiscal foram garantidos por depósito judicial”.

PSDB é contrário

Uma das principais resistências ao projeto na base de Tarcísio está na federação PSDB/Cidadania, dona da terceira maior bancada da Alesp, com 12 deputados. Parlamentares da sigla justificaram reservadamente ao GLOBO que não seria coerente votar a favor de um projeto que anula uma decisão sanitária adotada justamente no governo tucano. Além disso, dizem que o projeto abre mão de uma receita significativa e não devolveria o dinheiro a quem já pagou as infrações.

Segundo os deputados do PSDB , Tarcísio ligou na tarde da última terça-feira para o líder da federação, Vinicius Camarinha, pedindo apoio da bancada ao projeto. Parlamentares relataram que o governador teria argumentado que a anistia é importante para ele e um compromisso com Bolsonaro.

Camarinha nega a conversa. O governo de São Paulo também nega que Tarcísio tenha feito a ligação.

O governador marcou uma reunião com a base aliada na próxima terça-feira, dia da votação do projeto, para fechar questão sobre o assunto. O encontro deve ocorrer no Palácio dos Bandeirantes.

Deputados independentes foram procurados nesta semana por colegas da base pedindo voto favorável ao destaque da anistia em troca de apoio para aprovação de projetos de seu interesse. Não foi possível identificar se a articulação foi delegada ou se eles estavam assumindo pra si a função, segundo um relato de uma pessoa que não quis se identificar.

Um deputado do União Brasil afirmou que houve um “pedido habitual” para votar um projeto que é da base. “Nada fora do comum até o momento.”

A ideia de Tarcísio anistiar as multas aplicadas na pandemia foi revelada pelo GLOBO. O projeto era uma promessa do governador aos deputados bolsonaristas, que cobravam do ex-ministro da Infraestrutura mais acenos à base. O governador enviou o projeto, tido como o primeiro de cunho ideológico de sua gestão, no mês de agosto.

Segundo dados do próprio governo, foram realizadas cerca de 10 mil autuações, considerando o não uso de máscara e a proibição de aglomerações em estabelecimentos comerciais, estabelecimento informais, festas clandestinas, entre outros, e 579 transeuntes autuados pela não utilização de máscaras de proteção facial. As multas somam R$ 72,1 milhões, mas algumas foram pagas.

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