Como uma ala do PT pode ajudar Nunes a sabotar Boulos em São Paulo

Jilmar Tatto articula com vereadores projeto para implementar tarifa zero ainda na gestão do emedebista, o que deve ajudá-lo na corrida eleitoral

Ricardo Nunes e os irmãos Arselino e Jilmar Tatto

Ramiro Brites - Veja

O deputado petista Jilmar Tatto conversa com vereadores de São Paulo para acelerar o projeto de tarifa zero do transporte público da capital paulista. Mais de uma iniciativa está em andamento na Câmara Municipal, enquanto o prefeito Ricardo Nunes espera que a SPTrans finalize um estudo de viabilidade, que pode ser entregue até 30 de setembro, segundo defensores da proposta.

A articulação do petista é vista por aliados de Guilherme Boulos como uma “cama de gato” contra o psolista, oficialmente pré-candidato do Partido dos Trabalhadores para as eleições de 2024. Pela primeira vez desde a redemocratização, não será líder de uma chapa na disputa pela Prefeitura paulistana.

A sigla abriu mão da candidatura própria em uma negociação que envolvia a retirada de Boulos na corrida ao governo do estado de São Paulo, em 2022, concentrando o apoio da esquerda ao atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad. O movimento foi duramente criticado por Jilmar Tatto, que lidera um grupo com força no diretório municipal do PT.

O texto que está mais avançado na Câmara Municipal foi escrito pelo vereador Paulo Frange e protocolado como uma proposta da Comissão de Finanças e Orçamento. O projeto prevê a isenção para beneficiários de programas sociais registrados no Cadúnico, e desempregados, conforme o Caged. Esse projeto tramita, agora, na Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa.

“A gente espera que esse assunto passe pela CCJ, no máximo na próxima semana ou na outra. Aí ela deve ir para a comissão de mérito, que é a Comissão de Transporte e, em seguida, ela volta para a comissão, que finaliza, isso que é a de Finanças”, projeta Paulo Frange.

A outra proposta, com maior participação do deputado federal Tatto, trata da criação de um fundo municipal que financie a tarifa zero também para cidadãos empregados. Nesse caso, os empresários, que empregam cerca de 4 milhões de trabalhadores em São Paulo, repassariam o valor do vale-transporte ao fundo — o montante seria de quase 11,5 bilhões de reais — que financiaria o transporte público paulistano. O texto também é elaborado por Frange.

“Sobre o fundo (municipal de transporte), a gente ficou de apresentar uma minuta na próxima quarta-feira na Comissão de Finanças, discutir se alguém tem uma ideia melhor para poder aprimorar o texto e apresentar o projeto de lei”, explica o vereador, que tenta viabilizar a votação conjunta dos dois projetos.

Há ainda uma possibilidade de, após a conclusão das pesquisas da SPTrans, um projeto substitutivo ser apresentado pela Prefeitura, abrangendo as duas propostas que partem do Legislativo municipal.

“Há completo alinhamento de grande parte dos vereadores da Casa, com a ideia que o prefeito Ricardo Nunes levantou meses atrás e pediu os estudos técnicos”, revela Frange.

Conforme o vereador, há uma série de fatores, no período pós-pandemia, que permitem o andamento do projeto de forma responsável. Ele diz que, com o home-office, os ônibus transitam com ocupação de 76% da capacidade da frota, e há uma tendência de trabalhadores se mudarem para regiões mais próximas aos locais de trabalho. Frange propõe uma implementação gradual.

“O grande ganho da tarifa em todas as cidades que foram implementadas é o aquecimento da economia no próprio município, as pessoas andam mais, circulam mais e acabam comprando mais”, analisa.

“Começamos (a implementar a tarifa zero) com (desempregados, segundo o) Caged e (registrados no) Cadúnico, depois domingos, depois funcionários públicos… Até que aprovando uma legislação, que é uma PEC, uma emenda à Constituição, que garante esse direito (à mobilidade) e outras fontes de financiamento, aí o governo federal vai aportar recurso. A gestão será toda municipal, mas uma boa parte dos recursos federais viriam às cidades que aderirem ao programa”, acrescenta.

Hoje, mais de 80 municípios adotaram o passe livre no Brasil, em um “movimento sem volta”, segundo Frange. No entanto, não há no mundo uma experiência em uma cidade do porte de São Paulo. A iniciativa, se sair do papel e funcionar, deve ter um impacto eleitoral efetivo.

Aliados de Nunes dizem que pode ser a grande marca que falta a sua gestão à frente da Prefeitura, o que explica o temor do PSOL, que hoje lidera as pesquisas de intenção de voto na capital paulista. Jilmar Tatto, derrotado na ideia de tentar eleger um prefeito petista, disse ao Radar que já falou inclusive com Tabata Amaral, pré-candidata do PSB, que corre por fora na disputa eleitoral.

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