Apoio a Boulos para a prefeitura de São Paulo em 2024 causa racha no PT

Gleisi e Juliano Medeiros confirmam acordo, mas vice-presidente do partido diz que não há nada acertado e defende candidatura própria

Guilherme Boulos

Johanns Eller - Blog Malu Gasspar/O Globo

A perspectiva de uma aliança inédita entre o PT e o PSOL na disputa pela prefeitura de São Paulo já provoca rachas entre petistas a um ano e quatro meses do pleito municipal.

Em conversa com a equipe da coluna, o vice-presidente nacional do PT Washington Quaquá disse não existir qualquer acordo para apoiar Boulos em 2024. Gleisi Hoffmann, dirigente nacional da legenda, e Juliano Medeiros, que comanda o PSOL, contestam Quaquá e dizem que houve sim um acerto entre os partidos.

Na eleição de 2022, Boulos desistiu de postular o governo de São Paulo mesmo tendo registrado 11% das intenções de voto em pesquisa do Ipespe, para endossar o petista Fernando Haddad. Em troca, a cúpula do PT prometeu apoio à sua candidatura para a sucessão de Ricardo Nunes (MDB) em 2024.

O próprio Lula explicitou a contrapartida em março do ano passado, ainda como candidato à presidência, na ocasião em que o PSOL decidiu apoiar Haddad.

O arranjo levou em conta o desempenho do psolista na disputa municipal de 2020, quando ele surpreendeu ao ir para o segundo turno contra Bruno Covas (PSDB), desbancando partidos tradicionais de São Paulo.

Ainda assim, alas paulistas da legenda e, agora, o vice-presidente nacional da sigla, o deputado federal pelo Rio de Janeiro Washington Quaquá, negam ter assumido qualquer compromisso.

“Esse acordo não existiu. A direção do PT nunca discutiu isso”, disse Quaquá, à equipe da coluna. “Não há por que apoiar o Boulos no primeiro turno. Lula ganhou na cidade, assim como Haddad."

Lideranças do PT paulista como o secretário nacional de Comunicação do PT, Jilmar Tatto, já questionaram a validade do acordo no passado e manifestaram preocupação com o desempenho da legenda na capital.

Quaquá defende que há várias alternativas a Boulos no PT, entre os quais estariam o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, e Ana Estela Haddad, mulher do ministro da Fazenda, entre outros nomes.

A insatisfação ganhou corpo no momento em que petistas questionam a fidelidade do PSOL, que controla o Ministério dos Povos Indígenas, no Congresso. O partido de Boulos votou em bloco contra o arcabouço fiscal, pauta prioritária para Lula.

"Abrir mão de candidatura significa entregar a hegemonia de esquerda ao PSOL, que é parceiro, mas tem tentado se diferenciar do PT como na votação do arcabouço fiscal”, afirma o vice-presidente da legenda.

Procurada, Gleisi Hoffmann rebateu as declarações de Quaquá.

“Presenciei e participei durante a campanha desse acordo. Ele foi muito importante para a campanha nacional e para a campanha no estado de São Paulo. É um erro político grande atacar e desmerecer o acordo”, afirma a presidente do PT. “Podemos cobrar posições políticas do PSOL e de Boulos em relação ao governo, mas desconhecer o acordo não é solução”.

Na mesma linha, o presidente nacional do PSOL, Juliano Medeiros, rejeitou a possibilidade de rompimento da aliança entre os partidos na capital paulista em 2024.

“O acordo está feito. O presidente Lula é um homem sério. Estamos dialogando com os dirigentes do PT de São Paulo para que tudo caminhe da melhor forma. Será cumprido, goste o amigo do Cláudio Castro ou não”, alfinetou, referindo-se à boa relação de Quaquá com o governador do Rio, que é do PL de Jair Bolsonaro.

A resistência a Boulos no PT, porém, não é só de Quaquá. Jilmar Tatto, que compõe a Executiva e tem questionado o acerto, declarou na semana passada ao Estado de S. Paulo que a aliança do PT com Boulos seria “burra”.

Tatto, que disputou a prefeitura em 2020 e apoiou o PSOL no segundo turno, diz temer o encolhimento da bancada petista na Câmara Municipal sem uma candidatura majoritária para puxar votos. Em abril, o secretário defendeu ao GLOBO a filiação de Boulos ao PT como solução para o impasse, mas a ideia não foi adiante.

Um aliado de Boulos na Câmara admite, sob reserva, que o apoio do PT é peça-chave para uma vitória do PSOL e reconhece que a temperatura aumentou diante das divergências em pautas governistas, mas aposta na capacidade de diálogo de Boulos e defende a “independência crítica” do partido no apoio ao Palácio do Planalto.

“Essa ala sectária encabeçada pelo Tatto engoliu um pouco a contragosto o pacto para 2024”, disse este deputado. “Qualquer acordo que se faça com dois anos de antecedência fica sujeito a chuvas e trovoadas”.

Gleisi reconhece que ainda falta definir os pilares da aliança e considera legítimas as preocupações eleitorais do PT paulistano, que já comandou a cidade com Luiza Erundina (1989-1992), Marta Suplicy (2001-2004) e Fernando Haddad (2013-2016) e terminou em sexto lugar em 2020, o pior resultado de sua história.

“Temos de agora construir as bases desse acordo com o PT de São Paulo e assegurar uma chapa de vereadores competitiva. Boulos tem sensibilidade e compromisso para fazer isso e tem competitividade para disputar a prefeitura”, afirmou a dirigente petista.

No ano passado, Boulos foi o deputado federal mais votado de São Paulo, com pouco mais de 1 milhão de votos. Ele também liderou o ranking na capital, onde arrematou 490 mil votos.

Na contramão do estado, Lula, Haddad e Márcio França (PSB), apoiado pelo PT na corrida do Senado, também lideraram na cidade. Interlocutores do atual prefeito, Ricardo Nunes, e do PL de Jair Bolsonaro veem o psolista como favorito nesse estágio inicial da disputa.

Lula, conhecido por deixar seus aliados se engalfinhar em disputas internas fratricidas para arbitrá-las no último minuto, ainda não se posicionou sobre o caso. Com o calendário eleitoral a seu favor, tudo indica que o presidente seguirá esse padrão no cabo de guerra paulistano.

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