Prefeitura de São Paulo fecha primeiro acordo de leniência de sua história com restituição de R$ 10 milhões aos cofres públicos

 Ganha a sociedade civil, que pode acreditar em uma Administração Pública que prioriza o combate à corrupção, a ética e a transparência na gestão pública


Daniel Falcão e Daniele Dobner Santos* - Estadão

O combate à corrupção requer, cada vez mais, o uso de diversas e complexas ferramentas anticorrupção trazidas pela Lei: cada caso traz à tona diferentes quebra-cabeças que necessitam, do Poder Público, muito empenho e, muitas vezes, da cooperação de terceiros na investigação e na resolução dos enigmas. É nesse sentido que os próprios envolvidos, enquanto peças desse jogo, podem colaborar com elementos essenciais às investigações, trazendo à luz do sol oportunidades para a Administração Pública - como a possibilidade de ressarcimento aos cofres públicos.

Para tanto, as pessoas jurídicas envolvidas na prática de atos ilícitos podem colaborar com o Poder Público por meio de acordos de leniência, que requerem cooperação, transparência e seriedade perante as revelações concedidas e os compromissos assumidos pelos colaboradores no decorrer do acordo.

Um acordo de leniência efetivo deve refletir o pleno envolvimento da pessoa jurídica no reconhecimento de suas condutas lesivas, a apresentação de elementos que propiciem a alavancagem investigativa da Administração Pública no desmantelamento das fraudes, bem como a integral reparação do dano causado, nos termos da Lei Federal nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção), que dispõe sobre as infrações imputadas objetivamente às pessoas jurídicas que mantêm relações com a Administração Pública no Brasil.

A Controladoria Geral da União (CGU) detém a competência para celebrar acordos de leniência no âmbito do Poder Executivo Federal. Até janeiro de 2023, conforme os dados publicados, já foram firmados 25 acordos de leniência, os quais representam mais de R$ 18,3 bilhões em ressarcimento aos cofres públicos federais.

Seguindo os passos da CGU, em uma ação inédita e histórica, a Prefeitura de São Paulo (PMSP), por meio da Controladoria Geral do Município (CGM/SP) e com a participação da Procuradoria Geral do Município (PGM/SP), firmou seu primeiro acordo de leniência com a empresa Medartis Importação e Exportação LTDA, subsidiária da companhia suíça Medartis AG, empresa especializada em instrumentos e materiais cirúrgicos para uso médico-hospitalar.

A Medartis adquiriu, em 2017, a empresa brasileira Extera Importação e Exportação LTDA, contra quem foi instaurado um Processo Administrativo de Responsabilização de Pessoa Jurídica, no âmbito da CGM/SP, em razão de condutas indevidas cometidas no âmbito de licitações e da execução de contratos firmados com a PMSP, na área da saúde, entre 2011 e 2017.

O acordo de leniência celebrado contemplou o pagamento de R$ 10.280.060,36, correspondentes ao ressarcimento pelos danos ao erário da Cidade e à multa prevista na Lei Anticorrupção. A Medartis também entregou informações e outros elementos que irão auxiliar na eventual responsabilização de agentes públicos que tenham tido condutas inadequadas no âmbito do caso.

A pergunta que fica é: quem efetivamente ganha com um acordo de leniência? A resposta é simples: todos ganham! Ganha a Cidade de São Paulo, com o conhecimento de informações e de provas trazidas pela empresa, capazes de permitir a eventual responsabilização de agentes públicos envolvidos em atos de corrupção, e ainda terá ressarcidos valores desviados ou pagos com sobrepreço, corrigidos monetariamente desde a prática do ato. Ganha, também, a empresa, que não sofrerá condenação administrativa e deverá adequar seu programa de integridade, com boas práticas de gestão, prevenindo a ocorrência de novos ilícitos. E, principalmente, ganha a sociedade civil, que pode acreditar em uma Administração Pública que prioriza o combate à corrupção, a ética e a transparência na gestão pública.

*Daniel Falcão, controlador-geral do Município de São Paulo

*Daniele Dobner Santos, procuradora do Município de São Paulo e coordenadora da Comissão de Acordo de Leniência da CGM

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