"Flexibilizar a Lei Antidrogas é facilitar a vida do traficante", artigo de Ricardo Nunes

Incentiva-se, também, o uso de substâncias que causam dependência química




Ricardo Nunes - Prefeito de São Paulo (MDB)

Folha de S.Paulo

Como prefeito de São Paulo, não posso deixar de me manifestar sobre um tema da maior urgência: a possível flexibilização da Lei Antidrogas. Isso porque, caso ocorra, entendo que estamos atenuando a percepção da gravidade sobre a dependência química e prejudicando o exaustivo trabalho que temos feito na direção da recuperação dos usuários e punição aos traficantes.

O Supremo Tribunal Federal realiza nesta quarta-feira (24) julgamento sobre a constitucionalidade do artigo 28 da lei 11.343/2006, que pode resultar na flexibilização da atual Lei Antidrogas.

Estamos enfrentando um grande desafio para salvar a vida de pessoas com dependência química, mas tenho certeza que teremos sucesso nessa batalha. O trabalho vem sendo desenvolvido. A prefeitura tem o Serviço Integrado de Acolhida Terapêutica (Siats), o Serviço de Cuidados Prolongados, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPs) e os Caps Álcool e Drogas. Além disso, são 1.022 vagas no Programa Redenção e mais 1.300 das comunidades terapêuticas, parceiras do governo do estado e que estão disponibilizadas também para a prefeitura.

Os 35 CAPs Álcool e Drogas são formados por equipes multidisciplinares, compostas por médicos, psicólogos, enfermeiros, farmacêuticos, assistentes sociais, educadores físicos, terapeutas ocupacionais e técnicos de enfermagem, entre outros profissionais que trabalham de maneira integrada aos outros equipamentos da rede de proteção.

Em abril, numa parceria da prefeitura com o governo paulista, foi inaugurado mais um equipamento que oferece atendimento conjunto de dependentes químicos no centro da cidade. Trata-se do Hub de Cuidados em Crack e Outras Drogas, no Bom Retiro, que ampliou as ações do antigo Centro de Referência de Álcool, Tabaco e Outras Drogas (Cratod).

Por outro lado, uma ação contundente da nossa Guarda Civil Metropolitana (GCM), em parceria com as polícias Civil e Militar, já resultou na prisão de mais de 180 traficantes num curto espaço de tempo.

Todas essas ações fortalecem a Política Municipal Antidrogas, implementada pelo saudoso prefeito Bruno Covas em 2018, por meio de projeto de lei aprovado pela Câmara Municipal.

Entendemos, entretanto, que flexibilizar a Lei Nacional Antidrogas implica facilitar e muito a vida dos traficantes —além de incentivar, sobretudo os jovens, o uso de substâncias que causam dependência química.

É importante ressaltar que o artigo 28 da lei 11.343/2006, que está em discussão quanto à sua constitucionalidade, não prevê o encarceramento dos que são surpreendidos da posse de drogas ilícitas para consumo pessoal. O artigo prevê o necessário controle jurisdicional, com imposição de medidas alternativas à prisão, como advertência, prestação de serviços à comunidade ou medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

Os exemplos estão aí. Foram absolutamente desastrosas as experiências recentes de países que flexibilizaram a legislação sobre drogas. Não devemos nem podemos mexer numa lei que, se não resolveu definitivamente o problema, pelo menos tem nos ajudado a melhor enfrentá-lo.

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