Irmão de Michelle comanda do Palácio dos Bandeirantes militância digital de Tarcísio

Cunhado de ex-presidente é administrador de, pelo menos, quatro contas que interagem com militância bolsonarista

Diego Torres e Michelle Bolsonaro

Bianca Gomes e Guilherme Caetano - O Globo

Irmão da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, Diego Torres, tem uma função estratégica no gabinete que ocupa no segundo andar do Palácio dos Bandeirantes. Além de assessor especial do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ele exerce a função de "apagador de incêndios" do chefe com a militância bolsonarista do estado.

Enquanto Tarcísio imprime sua marca própria à frente do Executivo paulista, Diego pilota o alter ego do governador nas redes sociais. Ele é administrador de ao menos quatro perfis paralelos, de teor mais radical, do governador.

Juntas, as páginas somam 1,3 milhão de seguidores no Instagram, e estão ligadas a outras contas no TikTok, Twitter, Facebook, Kwai, Gettr e YouTube, além de grupos de WhatsApp e canais do Telegram. O mais conhecido deles, chamado "Tarcisão do Asfalto", foi criado enquanto Tarcísio ainda era ministro da Infraestrutura no governo de Jair Bolsonaro, de quem Diego é cunhado.

Diego mantém prestígio com influenciadores e lideranças ao mesmo tempo que tem acesso ao círculo íntimo de Bolsonaro. Com isso, costuma fazer a ponte entre os dois grupos. Ele repassou à militância, por exemplo, a orientação de Bolsonaro, após seu retorno ao Brasil, para que os apoiadores "baixassem a fervura" da atuação digital, diante da ofensiva do Poder Judiciário contra bolsonaristas radicais que invadiram a sede dos Três Poderes em Brasília, no dia 8 de janeiro.

Sua missão também foi aplacar os ânimos da base de Tarcísio quando o governador foi até Brasília se encontrar com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), em especial Alexandre de Moraes. A militância cobrava explicações do governador pelo que consideravam uma “traição”, e Diego foi a campo para debelar a maior crise, justificando que Tarcísio tinha um papel institucional a cumprir.

Deputados estaduais também recorrem a Diego para enviar recados da bancada bolsonarista da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) ao governador. As principais queixas dizem respeito à falta de indicações da ala ao Palácio e à ausência de pautas ideológicas no governo.

As páginas são seguidas pelo próprio Tarcísio e por secretários e integrantes do governo paulista. A maior parte das publicações faz defesa do governo, com divulgação das principais ações, e ataques à esquerda a à imprensa — tema que agrada aos bolsonaristas.

Como o governador tem poupado críticas a Lula, esses perfis resgatam falas de Tarcísio da época em que ele era candidato ou ministro de Bolsonaro.

"Lobo solitário"

Diego é descrito por funcionários do Palácio como um “lobo solitário”. Não tem uma equipe própria e interage pouco com os outros integrantes do governo. Quando é visto na sede do Executivo Estadual, está geralmente acompanhado de pessoas de fora da gestão.

O fato de ser irmão da ex-primeira-dama não deu a Diego liberdade para atuar livremente no governo. O cunhado de Bolsonaro tem vivido sob a tutela do chefe da Casa Civil, Arthur Lima, que pede satisfação sobre os encontros marcados pelo assessor e até sugere conteúdo para as páginas que ele comanda.

Apesar de ter sido contratado para ser assessor especial do governador, cargo para o qual recebe uma remuneração de R$ 20,3 mil mensais, Diego não é frequentador assíduo das agendas de Tarcísio e, diferentemente das pessoas que o antecederam, ele não participa das articulações políticas envolvendo prefeitos e deputados não bolsonaristas e nem acompanha o andamento de obras ou projetos de secretarias. Procurado, Diego não quis se manifestar.

Extremismo ao redor

Os perfis paralelos repercutem críticas que o próprio alto escalão do governo evita. Um funcionário do palácio relatou ao GLOBO que Arthur Lima chegou a questionar a secretária de Políticas para a Mulher, Sonaira Fernandes — a mais identificada com o bolsonarismo —, sobre uma publicação feita por ela com ataques ao presidente Lula. A preocupação de auxiliares de Tarcísio é que o comportamento da cúpula do governo melindre o Palácio do Planalto, com quem o governador precisa ter boa relação.

Nas páginas de Diego, no entanto, esse tipo de publicação é compartilhado com destaque. "Atraso no Brasil: Lula veta as matérias de programação e robótica no ensino médio. Avanço em SP: Tarcísio anuncia curso de programação no currículo escolar do estado", dizia uma das publicações, de autoria de Sonaira, que rendeu o puxão de orelha na secretária.

Sonaira também recebeu orientação da própria comunicação do governo para tornar suas redes sociais mais institucionais do que políticas. Segundo apurou O GLOBO, o sumiço das publicações ideológicas incomodou o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente e padrinho político de Sonaira. O “Zero Três” disse para a secretária continuar com as postagens mesmo a contragosto do governo. Caso contrário, poderia perder o seu capital político — necessário para disputar uma vaga na Câmara Municipal no ano que vem.

O conselho foi acolhido. E, além de sua página pessoal, Sonaira usou recentemente o perfil oficial de sua secretaria para falar sobre mulheres que foram testemunhas da ressurreição de Cristo, tema sem ligação com a pasta. A publicação irritou a cúpula do governo.

O secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite (PL), também bolsonarista, recebeu a mesma orientação que Sonaira, mas, ao contrário dela, ele resolveu adotar o tom institucional em todos os perfis.

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