Choque de culturas em SP

Pressão contra secretária de Cultura mostra que moderação de Tarcísio não interessa ao bolsonarismo

Marília Marton e Tarcísio de Freitas

OPINIÃO DO ESTADÃO

Aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro querem derrubar a secretária de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, Marília Marton. Esse fato deveria estar em destaque no currículo da sra. Marton, como um atestado de sua competência. Afinal, se a secretária está sendo atacada pelo bolsonarismo, é porque deve estar cumprindo bem sua função.

Para atingir seu desiderato destrutivo, os bolsonaristas usam qualquer pretexto, sem qualquer consideração por questões técnicas, administrativas ou morais. Os notórios deputados Eduardo Bolsonaro, expoente da prole do ex-presidente, e Mario Frias, representando o que de pior o governo de Bolsonaro produziu na área da Cultura, atacaram a secretária Marton depois que a TV Cultura, emissora pública paulista, veiculou em seu canal no YouTube um documentário a respeito do papel da extrema direita nos ataques golpistas do 8 de Janeiro.

Mário Frias, por exemplo, escreveu no Twitter que a secretária estava permitindo que “a extrema esquerda continue utilizando a máquina pública cultural paulista para manter sua agenda”. Já Eduardo Bolsonaro declarou que o episódio caracterizava “discurso ideológico e uso da máquina estatal em favor da política”.

Alguém precisa dizer a Eduardo Bolsonaro e a Mario Frias que a secretária de Cultura não tem ingerência sobre a programação da TV Cultura, administrada pela Fundação Padre Anchieta. Também não se vai perder tempo aqui destacando a falta de coerência do discurso desses bolsonaristas, tão zelosos ao defender a liberdade de expressão para proferir suas barbaridades contra a democracia brasileira e, ao mesmo tempo, tão críticos à veiculação de um documentário de cujo conteúdo discordam. Afinal, bons liberticidas são aqueles para os quais só a patota bolsonarista é digna de ter direitos.

O que importa, aqui, é notar o contraste entre as expectativas do bolsonarismo a respeito da gestão de Tarcísio de Freitas em São Paulo e a realidade do trabalho do governador. Não é segredo para ninguém que os sabujos de Bolsonaro esperavam que Tarcísio, por ter sido eleito graças a seu padrinho, fizesse de São Paulo uma cidadela do bolsonarismo.

Mas Tarcísio tem se destacado pela moderação. Não teve problemas em apertar a mão de Lula da Silva nem de trabalhar em parceria com o presidente para ajudar os atingidos pelas chuvas no litoral paulista logo no início de seu mandato. Ademais, escolheu um secretariado majoritariamente técnico, sem fazer muitas concessões ao bolsonarismo.

A secretária de Cultura é um bom exemplo dessa opção do governador pela gestão em vez do extremismo. Logo que assumiu, Marília Marton declarou, em entrevista ao Estadão, que “a cultura não tem e nem deve ter ideologia”. Que contraste com o que se viu no governo Bolsonaro, que chegou a ter um secretário de Cultura capaz de repetir ipsis litteris um discurso nazista para dizer que “a arte brasileira da próxima década será heroica e será nacional”.

Roga-se ao governador Tarcísio que resista ao extremismo e não permita que a cultura do ódio bolsonarista destrua a cultura do empreendedorismo e da criatividade paulista.

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