"A Agenda Tebet", artigo de Felipe Salto

Esforço para revisar políticas que hoje têm polpudos espaços no Orçamento, mas sem resultado à altura, poderia gerar uma ‘pequena’ revolução

Felipe Salto* e Simone Tebet

Espaço Aberto - Estadão

A ministra Simone Tebet passou a conversar com interlocutores da sociedade civil para falar da agenda econômica do governo. Tebet montou uma ótima equipe, que trabalha em pautas potencialmente importantes para modernizar a gestão das contas públicas. Nesta semana, recebemos a visita da ministra, que gentilmente aceitou meu convite para uma conversa na Warren Rena.

No Ministério do Planejamento e Orçamento, Tebet elaborou uma agenda prioritária: a adoção das revisões periódicas do gasto (as spending reviews), a reformulação do Plano Plurianual (PPA), a avaliação de políticas públicas e a colaboração com a Fazenda em temas como o novo arcabouço fiscal e a reforma tributária.

O PPA precisa ter maior importância no regramento orçamentário. Da forma como é hoje, não constitui uma baliza para a elaboração das propostas orçamentárias anuais. Ele acaba sendo adaptado ao sabor da conjuntura. É o simétrico oposto do que se espera de um planejamento estratégico. O PPA, infelizmente, não funcionou, apesar da boa intenção dos constituintes, há 35 anos, que introduziram esse elemento no Capítulo de Finanças Públicas.

A ideia do PPA como instrumento de planejamento de médio prazo vinculado ao processo de elaboração anual do orçamento público é, no fundo, o resgate da essência contida na Constituição Cidadã. Mas, para funcionar, os agentes políticos precisam ser expostos aos incentivos corretos.

Ora, é a divisão de recursos orçamentários para emendas parlamentares – que se dá numa parcela restrita do orçamento anual – o principal atrativo para o Congresso. Não há nada de errado, a priori, mas esse tipo de atuação acaba atraindo muito mais do que as discussões de maior fôlego no bojo das atividades de planejamento e gestão.

É assim que, a meu ver, o PPA precisa ter uma ligação umbilical com as propostas anuais para o Orçamento, estabelecendo, inclusive, por meio de um cenário projetado para o PIB e as variáveis fiscais, o espaço orçamentário prospectivo sobre o qual os orçamentos anuais poderão ser elaborados. Nesse modelo, na hora de debater o projeto do PPA, todos se interessariam em participar, pois ele teria o condão de definir a restrição fiscal dos anos subsequentes.

O PPA também precisa ser subsidiado por cenários macroeconômicos fidedignos, com projeções bem calculadas. E os projetos e programas prioritários, no PPA, deveriam pautar a elaboração dos orçamentos anuais. Essa escolha de projetos deveria envolver os Estados, resgatando esse componente de desenvolvimento regional que se perdeu, em geral, na formulação de políticas públicas no Brasil.

A revisão periódica de gastos e a avaliação de políticas são dois meios importantes para abrir espaço fiscal ao longo do tempo. A verdade é que o desafio das contas públicas vai além da apresentação de um novo arcabouço ou conjunto de normas de controle. Este é essencial, sim, sobretudo para ancorar as expectativas dos agentes econômicos. A dívida em relação ao PIB tem de ter um horizonte de estabilização; não pode, simplesmente, ficar solta no ar. Entretanto, para aproveitar o espaço fiscal e orçamentário e melhor atender às demandas sociais, não basta o equilíbrio macrofiscal.

É preciso avaliar as políticas que estão, há décadas, penduradas no Orçamento e, pior, incrementadas de modo inercial. Leany Lemos, João Villaverde, Renata Amaral, Gustavo Guimarães, Paulo Bijos, Daniel Couri e Sérgio Firpo formam um time que, liderados por uma política experiente e com boas relações no Congresso, poderá fazer grandes coisas pela eficiência do gasto público.

A título de exemplo, conseguimos montar um programa de avaliação de benefícios tributários, quando eu estava na Secretaria da Fazenda e Planejamento de São Paulo, em 2022. A iniciativa foi reconhecida pelo Tribunal de Contas do Estado. Começamos a produzir indicadores para guarnecer análises e diagnósticos – primeiro passo para ajustes futuros bem feitos. O trabalho foi comandado pelo subsecretário da Receita Estadual, Luiz Márcio de Souza, e pelo chefe do Departamento de Estudos Tributários, Carlos Gomes, ambos auditores fiscais do nosso Estado.

A fala da ministra Simone Tebet, na Warren Rena, foi na direção certa. É provável que tenhamos bons avanços, nos próximos anos, em matéria de planejamento e orçamento. Ainda que os efeitos fiscais, do ponto de vista das economias a serem produzidas, possam surgir apenas no médio prazo, temos de ter claro: em meio a tamanha rigidez orçamentária (cerca de 94% do Orçamento é obrigatório no caso da União), esse tipo de iniciativa tende a ser a saída mais palatável.

Este esforço para revisar políticas públicas que hoje contam com polpudos espaços no Orçamento, mas sem resultado à altura, poderia gerar uma “pequena” revolução em matéria fiscal e econômica. De um lado, cabe entender que o ajuste requerido para estabilizar a relação dívida/PIB será expressivo, da ordem de R$ 300 bilhões em três anos; de outro, buscar alternativas novas para melhorar a eficiência do gasto e, assim, colaborar para o crescimento econômico.

É preciso avançar com a Agenda Tebet!

*FELIPE SALTO - ECONOMISTA-CHEFE E SÓCIO DA WARREN RENA, FOI SECRETÁRIO DA FAZENDA E PLANEJAMENTO DO ESTADO DE SÃO PAULO E O 1º DIRETOR-EXECUTIVO DA IFI

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