“Sobre o racismo estrutural”, artigo de Edson Lau


Vidas negras importam. Se você não está pronto para entender esta mensagem, não use a palavra “liberdade” no seu vocabulário

A imagem pode conter: Edson Lau Filho, barba e terno

Aos que ainda não sabem, o racismo estrutural é silencioso, composto de práticas culturais e históricas que ao longo dos anos “naturalizaram” atos e falas racistas, que rebaixam nosso povo a posições de servidão. É muito fácil para que qualquer um perceba isso. Assim que a pandemia acabar, a circulação voltar ao normal e os encontros sociais tornarem a acontecer, basta observar à sua volta: os locais de poder, palácios, encontros empresariais e espaços exclusivos, como bons restaurantes, shoppings e aeroportos. A maioria absoluta, para não dizer que os únicos negros e negras que lá estarão, provavelmente serão garçons, seguranças ou membros da equipe de limpeza. Por quase seis anos eu tive o status de Secretário de Estado, percebia isso diariamente.

Alguns dados nos ajudam a entender:

Reportagem da Folha de S.Paulo trouxe um levantamento que, apesar de ser mais de metade da população, os negros ocupam apenas 18% dos cargos de liderança. Segundo o Dieese, negros ganham em média 37% menos que os brancos que têm a mesma formação. Levantamento do IBGE aponta que os negros são também a maioria (cerca de 64%) dos desempregados. Segundo ao Atlas da Violência, 75% das mais de 67 mil vítimas de assassinatos que aconteceram no Brasil em 2017 foram homens negros e mulheres negras, sendo a maioria composta por jovens. Na pandemia do Covid19, já existem estudos que apontam que a cada 3.1 hospitalizações de pretos ou pardos, acontece um óbito, contra 1 a cada 4.4 de pessoas brancas.

Essa disparidade histórica parece que ao invés de diminuir tem se aprofundado e relativizado, principalmente por conta do discurso irresponsável e ignorante daquele que, por ora, ocupa do Palácio do Planalto e dos asseclas que o reproduzem. Marcha que esteticamente rememora a Ku Klux Klan, falas parafraseadas de Mussolini e copos de leite sendo tragados… são apenas alguns sintomas da doentia marcha da insensatez brasileira.

No Paraná, há quem não dê bola para esta situação. Alegam que o Paraná, diferentemente do que acontece no resto do Brasil, tem poucos negros. Muito pelo contrário, segundo o último Censo do IBGE, somos cerca de 1/3 da população, ou seja cerca de 3 milhões de paranaenses são afrodescendentes. A história e costumes do Paraná são permeadas pela presença do povo preto, apenas para citar: temos a Congada da Lapa, o Fandango no Litoral e o barreado, talvez o principal prato paranaense. O Paraná é o estado mais preto do sul.

Mesmo sendo 1/3 da população paranaense, temos em Curitiba apenas 1 dos 38 vereadores, 2 dos 54 deputados estaduais, nenhum dos deputados federais, nenhum dos senadores, nenhum secretário municipal da capital, apenas um secretário do estado (o Secretário Rene, da Fazenda) e, segundo o Censo do Poder Judiciário, promovido pelo CNJ, apenas 5,5% dos magistrados do TJ-PR são pretos e pardos.

Podemos aqui praticamente repetir a frase dita por Malcolm X, líder negro dos Estados Unidos, ainda nos 60: “Esta chamada democracia tem falhado com o negro”. É óbvio que o sistema falha, políticas públicas e leis não são feitas, executadas ou julgadas por quem sofre na pele as consequências nefastas do racismo.

Enquanto os governantes e parlamentares paranaenses ressaltarão o quebra-quebra de ontem, protagonizado especialmente por aqueles que não têm interesse em por fim ao racismo ou dar visibilidade à causa antirracista, prefiro lembrar porque milhares de negros mundo afora têm repetido a agonizante fala de George Floyd “Não consigo respirar”.

No Brasil, a cada 23 minutos perdemos mais um “João Pedro” para a violência. É mais seguro andar fantasiado de soldado americano no Oriente Médio do que ser um jovem negro na periferia das grandes cidades brasileiras. Até quando? Até quando o silêncio? Até quando a falta de ação? Até quando a omissão? Até quando estarão mais preocupados com as lamentáveis queimas de bandeiras do que com as vidas perdidas?

Malcolm X disse que “Não lutamos por integração ou por separação. Lutamos para sermos reconhecidos como seres humanos.”

Vidas negras importam. Se você não está pronto para entender esta mensagem, não use a palavra “liberdade” no seu vocabulário.

Edson Lau é Presidente do Diretório Municipal do PSDB de Curitiba

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