Secretário de Comunicação, Wajngarten omitiu da Presidência sua relação com empresas pagas pelo governo
Em declaração assinada, chefe da Secom deixou de dar informações à Comissão de Ética; secretaria diz que lei foi cumprida

Fabio Wajngarten, chefe da Secom, e Jair Bolsonaro
Fábio Fabrini e Julio Wiziack - Folha.com
Ao ser nomeado para chefiar a Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência), Fabio Wajngarten omitiu da Comissão de Ética Pública da Presidência informações sobre as atividades de sua empresa e os contratos mantidos por ela com TVs e agências de propaganda que recebem dinheiro da própria secretaria, de ministérios e de estatais do governo Jair Bolsonaro.
O secretário foi questionado pelo colegiado em 12 de abril do ano passado, dia em que assumiu a pasta, sobre as participações societárias dele próprio e de parentes em pessoas jurídicas que operam em área afim à competência do seu cargo e que, portanto, poderiam gerar conflito entre os interesses público e privado.
Ao longo de um questionário de oito páginas, assinado por ele em 14 de maio e obtido pela Folha, ele omitiu o ramo de atuação das companhias dele e de familiares, bem como os negócios mantidos por elas antes e no momento em que ocupou a função pública.
A lei de conflito de interesses (12.813/2013) obriga os integrantes do alto escalão do governo a detalharem dados patrimoniais e societários, assim como as empreitadas empresariais e profissionais deles próprios e de seus familiares até o terceiro grau.
O objetivo é o de prevenir eventuais irregularidades. É vedado aos agentes públicos manter negócios com pessoas físicas ou jurídicas que possam ser afetadas por suas decisões.
A Folha teve acesso à cópia da declaração confidencial de informações, preenchida pelo secretário e entregue ao colegiado. Nela, ele se compromete com a “veracidade dos fatos” relatados e se responsabiliza por “possíveis omissões que possam resultar na transgressão de normas que regem a conduta do cargo”.
Como noticiou a Folha em 15 de janeiro, Wajngarten é sócio, com 95% das cotas, da FW Comunicação, que faz estudos de mídia para o mercado publicitário.
A empresa mantém contratos com agências e TVs (entre elas Record e Band) contratadas pela Secom e outros órgãos do governo, incluindo estatais.
Na gestão dele, as clientes passaram a ter percentuais maiores da verba da secretaria. A pasta também dita as diretrizes de propaganda para os demais órgãos federais e, não raro, aprova seus investimentos na área.
Após as reportagens da Folha, a Comissão de Ética solicitou novas informações a Wajngarten e deve começar a julgar o caso em 19 de fevereiro. O chefe da Secom tem negado irregularidades.
Questionado pela reportagem no mês passado se as atividades de sua empresa e os contratos por ela firmados foram detalhados ao colegiado ao assumir o cargo, ele respondeu: “Isso jamais foi questionado”.
No documento, Wajngarten foi questionado se exerceu atividades econômicas ou profissionais, nos 12 meses anteriores à ocupação do cargo, em área ou matéria relacionada às suas atribuições públicas.
Respondeu que não, embora fosse sócio da FW desde 2003 e só no dia 15 do mês anterior tenha deixado oficialmente de ser seu administrador (mas permanecendo como sócio majoritário).
Ele também foi indagado se, no período de um ano até a nomeação, recebeu suporte financeiro de entidades privadas que operam na mesma seara da Secom ou firmou contratos com elas para “recebimentos futuros”. Disse "não".
Naquela data, Record e Band, que recebem recursos da pasta e de outros órgãos federais, já eram clientes da FW, situação que perdurou ao menos até janeiro, quando a Folha publicou a primeira reportagem sobre o caso.
A Artplan, agência que presta serviços à secretaria desde 2017, também era contratante da empresa.
Na época, Wajngarten negou ainda que exerceria, concomitantemente ao cargo na Presidência, “atividade ensejadora de potencial choque entre o público e o privado".
“Não vislumbro situações de potencial conflito de interesses que envolvam meu patrimônio e minhas participações societárias e nem os de meu cônjuge, companheiro, filhos ou outras pessoas que vivam sob minha dependência”, declarou.
A comissão também quis saber se o secretário tem parente, até o terceiro grau, que atuava, era sócio ou empregado de pessoa jurídica da mesma área ou matéria relativa às atribuições do cargo. Foi novamente taxativo: “Não”.
Na FW, Wajngarten é sócio da mãe, Clara, que tem os outros 5% das cotas.
A mulher dele, Sophie Wajngarten, tem participações na CCB Design Publicidade, prestadora de serviços de computação gráfica para publicidade e marketing direto, entre outros; e na Cucumber Propaganda e Soluções Criativas, uma agência que, segundo seu contrato social, “distribui publicidade aos veículos e demais meios de divulgação”. Até 2014, esta empresa estava em nome da irmã do secretário, Bianca.
Wajngarten sustenta que a CCB e a Cucumber não atendem ao setor público.
Em 15 de abril do ano passado, três dias após assumir a Secom, o secretário entregou à Junta Comercial de São Paulo documento nomeando como administrador da FW o empresário Fabio Liberman, seu amigo de infância.
Como mostrou a Folha em janeiro, em seguida ele escalou para ser seu adjunto na Secom o irmão do gerenciador, Samy Liberman.
Segundo na hierarquia da pasta, Samy também teve de entregar à Comissão de Ética uma declaração confidencial de informações em maio. Questionado se tinha parente atuando em área correlata à do seu cargo, ele também negou.
Procurada pela Folha, a Secom negou, em nota, que tenha havido omissão de informações à Comissão de Ética da Presidência. Segundo a secretaria, Wajngarten "cumpriu rigorosamente o que a legislação determina”.
Na declaração formal feita à comissão, ele informa que entregaria uma cópia da sua declaração de Imposto de Renda.
A legislação sobre conflito de interesses proíbe o agente público de exercer atividade que implique a “prestação de serviços ou a manutenção de relação de negócio” com empresas com interesse nas suas decisões.
Também veda que o ocupante de cargo no Executivo pratique “ato em benefício de pessoa jurídica de que participe ele próprio, seu cônjuge, companheiro ou parentes até o terceiro grau”, ou mesmo que “possa ser por ele beneficiada ou influenciar seus atos de gestão”.
Outra restrição é quanto a exercer, “direta ou indiretamente”, atividade privada que em razão da sua natureza seja incompatível com as atribuições do cargo ou emprego. Considera-se como incompatível a atividade “desenvolvida em áreas ou matérias correlatas”.
Na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro disse não ter visto “até agora” nada de errado na atuação de Wajngarten.
O Ministério Público Federal em Brasília pediu à Polícia Federal a abertura de inquérito criminal para investigar suspeitas sobre o chefe da Secom.
O objetivo é apurar supostas práticas de corrupção passiva, peculato (desvio de recursos públicos feito por funcionário público, para proveito pessoal ou alheio) e advocacia administrativa (patrocínio de interesses privados na administração pública, valendo-se da condição de servidor).
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