Auditoria descobre desvio de R$ 54 mi da Prefeitura de SP durante gestão de Haddad


Segundo os auditores, os desvios ocorreram por meio de várias manobras contábeis na folha de pagamento de 250 funcionários contratados para entrevistar as famílias

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O ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT)

Guilherme Balza - GloboNews

Uma auditoria detalhada feita pela Controladoria-Geral do Município de São Paulo descobriu um desvio de R$ 54 milhões nas contas da Prefeitura de São Paulo em um único contrato, assinado sem licitação. A reportagem da GloboNews teve acesso, em primeira mão, ao relatório da auditoria.

Ao todo, foram encontradas 12 irregularidades no contrato. O rombo foi provocado pela Fundac (Fundação para o Desenvolvimento das Artes e Comunicação), contratada pela Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (Smads) para fazer o cadastramento de famílias de baixa renda na cidade nos Centro de Referência de Assistência Social (CRAS). Em nota, a Fundac nega irregularidades. (leia nota abaixo). Já a Smads disse que vai aguardar o relatório final da Controladoria para definir as ações necessárias.

Segundo os auditores, os desvios ocorreram por meio de várias manobras contábeis na folha de pagamento de 250 funcionários contratados para entrevistar as famílias.

A fundação informava à prefeitura gastos fictícios ou calculava encargos trabalhistas com base em alíquotas muito maiores que as reais. E recebia o dinheiro da administração para pagamentos que, na prática, não existiam, de acordo com a auditoria.

O contrato foi assinado em novembro de 2013, na gestão do prefeito Fernando Haddad (PT), pela então secretária de Assistência Social, Luciana Temer, filha do ex-presidente Michel Temer. Não houve licitação.

Inicialmente, o prazo era de seis meses, a um custo de R$ 11 milhões. O termo, no entanto, foi prorrogado seis vezes, totalizando quatro anos de contrato. No fim das contas, a prefeitura gastou R$ 102 milhões, dos quais 54 milhões foram desviados, segundo a auditoria.

A prorrogação dos cinco primeiros termos do contrato foram feitos pela ex-secretária Luciana Temer, durante a gestão Fernando Haddad. Já a última renovação foi feita pelo ex-secretário Filipe Sabará, no governo de João Doria (PSDB), em 2017. Apesar disso, o nome de Sabará não é mencionado na investigação da Controladoria.

Ao longo dos quatro anos de contrato, a secretaria foi alertada ao menos cinco vezes por procuradores da pasta para fazer a licitação, mas os alertas foram ignorados.

Apesar das irregularidades, a Fundac continua realizando o serviço de cadastramento das famílias. No final de 2018, a fundação assinou um novo contrato para o serviço, dessa vez, após vencer um pregão. O novo contrato é de 24 meses, a um custo de R$ 21 milhões. O custo mensal é menos da metade do contrato analisado pela Controladoria.


Sem licitação

Apesar do tamanho do contrato, a Fundac foi contratada por dispensa de licitação por se tratar de uma entidade sem fins lucrativos.

As jurisprudências do TCU (Tribunal de Contas da União), TCE (Tribunal de Contas do Estado) e do TCM (Tribunal de Contas do Município) afirmam que a licitação só pode ser dispensada quando a entidade escolhida, além de não ter fins lucrativos, tenha especialização no serviço prestado. Outro requisito é não ter no mercado oferta de prestadores de serviço a ser contratado.

A auditoria concluiu que nada disso foi respeitado. Em primeiro lugar, a Fundac -como está informado no site da fundação e no cadastro na Receita Federal - é uma entidade voltada a apoiar projetos na área de comunicação e artes.

A fundação, por exemplo, é responsável pela TV Assembleia de SP há mais de dez anos, em um contrato inicialmente também assinado sem licitação. A entidade também assumiu a TV Justiça, do STF (Supremo Tribunal Federal) e tem vários contratos na área de comunicação com órgãos federais, estaduais e municipais.

A Fundac, segundo a auditoria, não tem expertise nem no serviço de intermediação de mão-de-obra, nem na área de Assistência Social. Além disso, há no mercado várias instituições capacitadas para fazer o mesmo serviço.

A própria secretaria entendeu que a dispensa de licitação era inadequada e decidiu adotar o modelo de pregão no contrato seguinte.


Entenda as irregularidades

Ao longo de quatro anos de contrato, a Fundac recebeu da prefeitura o pagamento das férias dos funcionários em triplicidade. Os encargos relativos às mesmas férias eram pagos três vezes, mas os funcionários só recebiam uma vez.

Em outra manobra, a fundação informou à prefeitura, durante quatro anos, gastos mensais de mais de R$ 10 mil com auxílio-creche, quando, na verdade, gastava R$ 220 por mês, pago a apenas uma funcionária.

Também houve irregularidades nos gastos com locomoção e aluguel de equipamentos. A prefeitura pagava todos os meses R$ 7.500 com locação de veículos para um coordenador que eventualmente precisava se locomover até um posto de trabalho. É o triplo do valor de mercado. A fundação não apresentou nenhum tipo de nota, extrato ou comprovante desses serviços.

Em outra irregularidade encontrada, a fundação computava como gastos a capacitação e treinamento de funcionários, mas, na realidade, quem fazia isso era a própria Secretaria de Assistência Social.

A conclusão da auditoria é que os custos fictícios foram convertidos em lucro para a fundação, o que é ilegal, uma vez que entidades desse tipo não têm fins lucrativos.

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