O novo PSDB, segundo Bruno Covas




Morris Kachani - Folha.com

“O PSDB do Aécio não é o meu PSDB. A luta é para tirá-lo do partido”

“Do ponto de vista ético, do ponto de vista moral, nada desabona Fernando Henrique Cardoso, ou Geraldo Alckmin e José Serra”

“Nenhum momento eu, João Doria ou qualquer tipo de pessoa defendemos ruptura com o estatuto do PSDB. A gente acredita que é preciso colocar mais luz sobre os problemas, não adianta colocar debaixo do tapete, não adianta tratar as questões em reuniões fechadas, em restaurantes caros”

“O PSDB errou quando não pediu o impeachment do Lula; o PSDB errou ao demorar para abraçar a causa do impeachment da presidente Dilma; o PSDB errou em inúmeras ocasiões, esperando as coisas acontecerem por si só, sem se manifestar, sem entrar em bola dividida, sem externar uma opinião. Essa é a principal questão que diferencia o novo do velho PSDB” 

“Doria é uma pessoa muito comunicativa, uma pessoa que fala muito bem, que sempre aparece. Enfim, ele tem um jeito e um estilo de ser que é dele. É ruim porque, às vezes, as pessoas esperam isso de mim”

“Passei o segundo turno verificando o que fazer em relação ao meu voto. Acabei anulando por não me sentir representado pelo Bolsonaro. Mas o Doria seguiu o que foi o meu pressentimento, a grande maioria dos filiados do PSDB acabou votando contra o PT e, consequentemente, no Bolsonaro”

Mais um a se enquadrar na chamada “nova política”, Bruno Covas tem 39 anos e chegou à Prefeitura quando João Doria a deixou para disputar a cadeira do Palácio dos Bandeirantes, em 2018. Em pouco mais de um ano de mandato, o neto de um dos fundadores do PSDB, Mário Covas, tenta reconstruir a imagem do partido e mobilizar a opinião pública a seu favor, de olhos nas próximas eleições à Prefeitura.

Covas defende a expulsão de Aécio do partido, de maneira enfática. Ao mesmo tempo, com relação a outros caciques tucanos acusados de envolvimento em esquemas de corrupção, ele adota um tom mais discreto e distante da polêmica.

Covas apoia-se na lealdade ferrenha a Doria e a seu projeto de governo, que afirma categoricamente seguir as diretrizes que moldaram o partido nas origens.

Enquanto a população em situação de rua cresce e a mobilidade urbana continua um problema, Covas assistiu a uma das principais medidas de sua gestão ser interrompida: a obra de revitalização do Anhangabaú, Arouche e Parque do Minhocão. Com o baque, e com as eleições municipais se avizinhando, o atual prefeito continua sua corrida contra o tempo.


ENTREVISTA
Por Gabriel de Campos

A Executiva Nacional do PSDB optou por não acatar o pedido de expulsão de Aécio Neves, feito pelo diretório de São Paulo, do partido. A votação acabou 30 a 4 em favor do deputado. Você é minoria nessa situação interna? Qual sua postura caso a sigla mantenha Aécio? Trocaria de partido?
Eu tenho certeza que quanto mais ampla for a consulta, em especial à base do partido, mais maioria meu pensamento se torna. Até porque é isso que colho em todos os cantos que vou e nas mídias sociais. O diretório do PSDB de São Paulo decidiu recorrer ao diretório nacional do partido, que é um colegiado mais amplo que a executiva, essa muito restrita às lideranças do partido. Agora, a gente aguarda a decisão do diretório nacional. Vou continuar persistindo: o PSDB do Aécio não é o meu PSDB, não me vejo representado por ele ou por esse tipo de atitude e vou continuar lutando até o fim para a sua saída. A luta é para tirá-lo do partido, esse é o plano.

Tirar Aécio e trazer Alexandre Frota?
Se o Alexandre Frota se compromete com os ideais e com o estatuto do PSDB, nenhum problema. Ele não responde a nenhum processo de desvio ético, de improbidade, portanto, do ponto de vista da ética, nada o desabona. Frota fazia parte do partido que elegeu o presidente da República, que é de uma linha diferente do PSDB, mas se ele se compromete a seguir o estatuto do partido, se sente mais representado pelo pelo PSDB, nenhum problema.

Vamos aguardar agora, depois de se filiar. Ele tinha uma posição clara, mas era filiado ao PSL, vamos verificar de que forma ele se comporta a partir daqui.

As pessoas ficaram um pouco surpresas, não esperavam que isso fosse acontecer, mas ninguém me ligou ou falou comigo para reclamar, xingar ou espernear por conta disso.

Hoje, o PSDB vive um momento de ebulição e está dividido. Qual o futuro do partido?
Acho que a diferença está no jeito de agir, não quanto à visão de mundo das pessoas ali. Nenhum momento eu, João Doria ou qualquer tipo de pessoa defendemos ruptura com o estatuto do PSDB, com a linha do PSDB de apostar na privatização mas manter o compromisso com o social. Nesta visão de mundo, nenhuma diferença; a diferença básica é no modo de agir. A gente acredita que é preciso colocar mais luz sobre os problemas, não adianta colocar debaixo do tapete, não adianta tratar as questões em reuniões fechadas, em reuniões em restaurantes caros. É preciso tratar de forma pública, de forma aberta, a democracia não pode mais ser vista como um ato que se exaure a cada dois anos quando a pessoa vota. Democracia, hoje, é um ato permanente de fiscalização, cobrança e participação das pessoas. As mídias sociais trouxeram este canal, que não existia antes. As pessoas têm acesso direto aos seus representantes, não precisam mais passar por um líder religioso, por um líder sindical, por um líder de bairro para ter acesso a esse representante, e a consequência disso é o dever permanente de se prestar contas. Da mesma forma que as pessoas têm acesso aos políticos, os políticos precisam ter acesso à população, essa comunicação se dá em dupla direção.

Lideranças como Fernando Henrique Cardoso, ou Geraldo Alckmin e José Serra, ainda podem ser considerados exemplos éticos e políticos às novas gerações da sigla?
Do ponto de vista ético, do ponto de vista moral, nada os desabona. Também da visão de mundo, acho que é muito mais uma questão da forma de se expressar, de ter opinião, de não esconder as opiniões. O PSDB errou quando não pediu o impeachment do Lula, quando o marqueteiro dele assumiu que recebeu dinheiro de caixa 2 vindo do exterior; o PSDB errou ao demorar para abraçar a causa do impeachment da presidente Dilma; o PSDB errou em inúmeras ocasiões, esperando as coisas acontecerem por si só, sem se manifestar, sem entrar em bola dividida, sem externar uma opinião. Essa é a principal questão que diferencia o novo do velho PSDB. 

O que precisa mudar de maneira enfática no PSDB, em 2020 e 2022, para evitar o fracasso que foi 2018? Juntar-se ao DEM é um caminho?
O resultado ruim que nós tivemos nas eleições do ano passado, a meu ver, se deve a dois grandes fatores. O primeiro deles, ter colocado para debaixo do tapete os problemas que envolvem membros do PSDB. Durante muito tempo a gente apontou para o PT, que defendia seus membros, e acabou a gente fazendo a mesma coisa, ao nem levar para o conselho de ética o caso do Aécio, por exemplo. A outra questão é não conseguir explicar qual a visão de mundo do partido. As pessoas deixaram de votar no PSDB em 2018 porque não tinham clareza quanto ao que o partido pensava, o que defendia e no que apostava. A gente acaba se deixando levar pela onda, tanto que no governo do PT, o PSDB era chamado de neoliberal, e no governo do Bolsonaro, somos chamados de comunistas. A gente não é uma coisa nem outra. Estamos à direita do PT e à esquerda do PSL, mas somos da linha da social-democracia, e precisamos externar e deixar mais claro o que é isso para a população.

Por exemplo, na Prefeitura de São Paulo, a gente continua a apostar exatamente nisso. Hoje, assinamos o primeiro contrato de concessão no Programa Municipal de Desestatização, com a concessão do Mercado Municipal de Santo Amaro. A expectativa é assinar pelo menos dez até o fim da gestão. Ao mesmo tempo, nós vamos ser a gestão que mais fez vaga em creche e que mais construiu unidade habitacional na cidade.

O que Mário Covas diria sobre João Doria e a atual fase do PSDB?
Olha, boa pergunta, taí uma coisa que eu gostaria de saber também

O que Doria te deixou de positivo e de negativo na Prefeitura da cidade?
De positivo, foi a coragem de fazer publicamente a defesa das privatizações, o PSDB nunca tinha tido essa clareza quanto à parceria com o setor privado. Buscou empresas para investir e doar à cidade de São Paulo; iniciou uma série de programas revolucionários, como na redução da burocracia: para se abrir uma empresa na cidade de São Paulo, levava mais de 100 dias, hoje leva, no máximo, quatro; o prazo médio de obtenção de um alvará era de 540 dias, hoje, dentro do Aprova Rápido, já está em 66 dias o prazo médio. Ele deixou uma série de boas iniciativas para podermos complementar, tanto que no meu discurso de posse, no dia 07 de abril de 2018, eu dizia que a prioridade era continuar o governo Doria. O que ele deixa de ruim é que é muito difícil acompanhar o estilo Doria. Uma pessoa que se comunica muito bem, que fala muito bem, e eu nunca vou me tornar um Doria para as pessoas. Sempre deixei claro que daria continuidade ao governo, mas o Doria é o Doria, e o Bruno é o Bruno.

Enfim, ele tem um jeito e um estilo de ser que é dele. É ruim porque, às vezes, as pessoas esperam isso de mim. Quando não existe certo ou errado, cada um tem o seu próprio estilo.

Como você enxergou a adesão do atual governador do estado de São Paulo, até pouco tempo atrás e desde as eleições de 2018, à plataforma de Bolsonaro?
No segundo turno, ele foi obrigado a fazer uma opção, e foi muito clara a escolha dele pelo Bolsonaro. Eu confesso que, no meu caso, estava muito claro não optar pelo PT, e passei o segundo turno verificando o que fazer em relação ao meu voto. Acabei anulando por não me sentir representado pelo Bolsonaro. Mas o Doria seguiu o que foi o meu pressentimento, a grande maioria dos filiados do PSDB acabou votando contra o PT e, consequentemente, no Bolsonaro.

Qual o seu futuro, concorrer na eleição à Prefeitura em 2020?
Enquanto as pessoas me deixarem, eu quero fazer política.

Candidaturas legislativas são fruto da vontade do político, e candidaturas ao executivo, da vontade do coletivo. É regar, plantar, para um dia colher. É muito difícil planejar médio ou longo prazo na política, porque precisa combinar com o zagueiro russo antes. Não adianta falar “vai ser assim em 2022, 2024, 2026, 2028…”, tem tantas variáveis no meio que é impossível saber.

Qual o problema que mais cresce na capital paulista hoje?
Nossa… é como perguntar a um pai que filho ele prefere. A gente tem alguns grandes problemas na cidade, como a questão da mobilidade, difícil de ser resolvida. Requer grandes investimentos, parceria com o Governo de Estado e com o Governo Federal, mudança nos hábitos das pessoas quanto à locomoção. Tem também um grande problema de população em situação de rua, que ampliou muito ao longo dos últimos anos, por conta da recessão econômica. Tanto que estamos antecipando o censo, que seria em 2020, para 2019. Temos um grande problema na área da saúde, porque, também por conta da recessão, muitas pessoas perderam o plano de saúde e o acesso ao médico particular, e estão buscando a rede municipal de saúde muito mais. É complicado escolher uma só questão. E a cidade de São Paulo tem também um grave problema que é a ilegalidade. Hoje, a expectativa é que de dez bares e restaurantes, sete não tenham alvará na cidade de São Paulo. Então, reduzir burocracias, aprovar anistia, regularizar a cidade de São Paulo é uma das metas da minha gestão.

Sobre as obras de revitalização no Vale do Anhangabaú, no Largo do Arouche e no Minhocão, algumas opiniões de pessoas e entidades ligadas às obras vieram à tona. O promotor de habitação e urbanismo da cidade criticou as obras, enquanto o presidente da Associação Preserva SP foi além e pediu sua paralisação na Justiça. O pedido foi atendido pela juíza Maria Fernanda de Toledo. Qual o propósito dessas obras, mesmo tão criticadas por quem está envolvido na questão?
Primeiro que, se você conseguir aprovar uma obra que seja consenso entre 12 milhões de habitantes, você me aponte, por favor, porque ainda não descobri. Toda obra causa incômodo, causa preocupação com o que o vai acontecer. Mas tenho toda tranquilidade que são obras importantes no processo de revitalização do centro de São Paulo. Foram amplamente discutidas pela população, mas chega um momento em que a Prefeitura decide. O processo de participação e discussão com a sociedade é importante, mas em algum momento, é preciso decidir fazer A ou B, e isso cabe àquele que tem o respaldo do voto, a quem está à frente da Prefeitura de São Paulo.

No processo do Anhangabaú, uma das questões levantadas pela Associação (Preserva SP), era que não havia tido audiência pública. Nós juntamos no processo, cópia da lista de presença da audiência pública, com a presença do diretor da Associação. Quer dizer, litigância de má fé. Tanto que já determinei, à Procuradoria Geral do Município, que processe a Associação pelos danos que causou ao erário municipal, por conta da paralisação das obras por uma semana.

A do Arouche, que se discute a questão da preservação do patrimônio paisagístico, nós passamos por todos os órgãos de controle antes de iniciar a obra. É exatamente isso que estamos demonstrando agora no processo, e aguardamos a liberação por parte da justiça.

Qual será seu principal legado como prefeito de São Paulo?
É difícil dizer, porque isso tá mais ligado ao que as pessoas vão valorar, do que o que eu acabar achando mais ou menos importante. Não sei se, ao final da gestão, as pessoas vão ter achado mais importante eu ter revitalizado o Anhangabaú ou ter entregue 85 mil vagas em creche. Isso tem muito mais relação com o que as pessoas acham que foi a marca, do que com a ação da Prefeitura. Talvez o Haddad, quando iniciou com as ciclovias, não imaginou que fosse virar a marca da gestão dele. Tinha ali outros programas, tinha outras ações, tinha outras iniciativas, mas acabou virando a marca da sua gestão. 

Por fim, você tem acompanhado os vazamentos da Vaza Jato, do The Intercept Brasil, de conversas entre procuradores da Operação Lava-Jato e juízes, entre os quais o atual Ministro da Justiça, Sergio Moro. O senhor acredita que os vazamentos prejudicam ou beneficiam a operação?
Eu acho que fortalecem a transparência. O fato de, recentemente, a procuradora ter feito um mea culpa e pedido desculpas o ex-presidente Lula no momento de perda, mostra que o que está ali tem alguma veracidade. 

A popularidade de Moro se manteve alta, mesmo após os vazamentos das mensagens.

É porque eu acho que em todas as mensagens que envolvem o Moro, até agora não ficou nada explicitamente configurado como “facilita isso, facilita aquilo”. O fato dele ter opinião, não significa que ele errou ao julgar. As mensagens vazadas até agora não possuem nada que possa, ao meu ver, comprometer os julgamentos que fez como juiz.

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