"Chalita no ninho petista", editorial do Estadão


O ESTADO DE S.PAULO


O convite do prefeito Fernando Haddad ao deputado federal Gabriel Chalita (PMDB) para ocupar a Secretaria Municipal da Educação tem tudo de uma vulgar manobra política e eleitoral, feita à custa de setor da mais alta importância da administração, que não deixa bem nenhum dos que dela participaram direta ou indiretamente, às claras ou na discrição dos bastidores. Como se isso não bastasse, nem mesmo as qualificações técnicas do futuro secretário, por muitos contestadas, podem ser alegadas para justificar uma escolha bem de acordo com velhas práticas que não costumam dar bons resultados.

Os entendimentos entre Haddad e Chalita, com as bênçãos e a inspiração do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, começaram há cerca de um mês e fazem parte das articulações políticas destinadas a facilitar a reeleição do prefeito no próximo ano, como mostra reportagem do Estado. O acordo pode levar a uma chapa que teria Chalita como candidato a vice. Que ele tenha aquilo que para o PT em princípio seria um estigma - ter sido figura de destaque no governo tucano de Geraldo Alckmin, como secretário de Educação - já não parece ter importância para Haddad e seus companheiros.

Para nos limitarmos aos fatos mais recentes relativos à falta de pudor com que o PT, tão logo chega ao poder, se alia aos que desancava no passado e àqueles ocorridos no âmbito municipal, recorde-se a aliança Lula/Maluf/Haddad. Na ânsia de eleger Haddad, na época um simples poste como se diz na gíria política, o ex-presidente não hesitou em buscar o apoio de seu arqui-inimigo e símbolo maior da pouca seriedade - digamos assim, apelando para uma fórmula benevolente - no trato das coisas públicas, e por isso mesmo campeão de processos na Justiça

A foto dos três sorridentes e de mãos dadas, uma exigência impiedosa de Maluf, consagrou o acordo e marcou para sempre a biografia de Lula. Guardando as devidas diferenças e dimensões, deve-se dizer que o caso Chalita é café pequeno. O que incomoda nesse episódio não são tanto as denúncias de enriquecimento ilícito contra Chalita, pois elas foram arquivadas pela Justiça por falta de provas - por elas, ele não deve nada. O que incomoda é a falta de pudor do PT na montagem de alianças - foi no ninho de seus inimigos tucanos que Chalita adquiriu notoriedade. Afinal, embora a essa altura de suas traficâncias políticas e das graves suspeitas que pesam sobre seu comportamento em casos cabeludos não lhe deva restar muito pudor, ele continua a posar de moralista.

O importante mesmo é o preço que os paulistanos poderão pagar pelo despudor. A competência profissional de Chalita, a julgar pela sua passagem pela Secretaria Estadual da Educação, está longe de ser ponto pacífico. O presidente do Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo (Sinpeem), Cláudio Fonseca, diz ver com apreensão a escolha de Chalita, pois "sua atuação na rede estadual foi contestada". Por isso, "ele vai ter trabalho para convencer que é a pessoa para esse momento de mudança".

Para outro especialista, a consultora Ilona Becskeházy, o critério que orientou a mudança de comando na Secretaria foi errado: "Esse arranjo político, e não o desenho de política pública, não funciona mais". E Salomão Ximenes, da organização Ação Educativa, se diz preocupado principalmente com a educação infantil, pois "o Callegari (o atual secretário, Cesar Callegari) se colocava aberto ao diálogo com as instituições que tratam do tema".

Aliás, Callegari, um técnico respeitado, foi a primeira vítima da mudança, não propriamente porque perdeu o cargo, mas pela situação constrangedora em que o deixou Haddad. Foi pela imprensa que ele soube da escolha de Chalita.

Esse é só mais um na sucessão de fatos que demonstram serem os conchavos e acordos, bem à moda antiga, o que orienta a ação de Lula e de Haddad, preocupados antes de tudo com a preservação do poder a todo custo, não com o uso que se deve fazer dele em benefício da população.

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