"Dois Brasis: um fala, o outro cala", artigo de Duarte Nogueira


Das manifestações que tomaram as ruas do Brasil em junho emergiram dois Brasis. Um que quer falar e ser ouvido, que clama por mudanças e por serviços públicos de qualidade, um Brasil mais escolarizado, que não quer apenas ter mais renda e poder de consumo, mas deseja ser cidadão. O outro é o Brasil atônito, paralisado, que não consegue dar respostas claras e concretas a esses desejos.

A dissonância entre esses dois mundos nos mostra que é preciso mudar a forma de fazer política. O Brasil 3.0 não aceitará mais que se mantenha a política 1.0. O sentimento das ruas, que por semanas inundou os noticiários, não pode apenas entrar para os livros de história como um mês marcado por protestos. Temos que cobrar e receber as devidas respostas e integrar estes dois Brasis tão distintos e com objetivos tão distantes.

O povo é soberano, é o fio-condutor de uma sociedade democrática. E não adianta nenhum partido político ou governo lançar mão de pseudo-propostas para adiar a solução. Não tem mais jeito. O Brasil, este das ruas – o que quer participar, falar e ser ouvido – não aguenta mais o país conservador, de mentalidade tacanha e baseado apenas num projeto de poder. E isso é ótimo. Não dá para aceitar a velha política neste novo mundo que habita os sonhos dos brasileiros.

O que a sociedade pede não é nada demais. Não tem supérfluo, menos ainda utopia. É um serviço público de qualidade. E ninguém quer isso dado. As pessoas pagam por isso. O que estão pleiteando é um sistema de saúde decente, transporte à altura dos trabalhadores e segurança para viver dignamente. Mais do que isso: as pessoas estão cansadas de, além de não terem o retorno da alta carga tributária que pagam, verem a falta de ética, a desonestidade e seu dinheiro sendo desperdiçado como se não houvesse amanhã.

A classe política está completamente desacreditada. Perdeu a credibilidade e não foi à toa. São mensaleiros que assaltaram os cofres públicos, uma Câmara que optou por não cassar um deputado-presidiário, loteamento de cargos em agências reguladoras e até mesmo no escritório da Presidência da República. Ninguém aguenta. Os brasileiros foram até muito tolerantes.

Falando francamente, não é momento de atitudes oportunistas. Já tivemos demonstrações de que políticos, partidos e governantes que tentarem se aproveitar do momento para fingir preocupação com a sociedade e que querem atender a famigerada “voz das ruas”, serão retaliados. Não tem pão e circo. Tem de haver, sim, mangas arregaçadas e trabalho calcado na ética, com um foco: o cidadão.

Duarte Nogueira é deputado federal e presidente do Diretório Estadual do PSDB-SP

Comentários