“Por um Brasil diferente”, análise do ITV


*Análise do Instituto Teotônio Vilela

No último sábado, Dilma Rousseff teve a infelicidade de encontrar pela frente um estádio coalhado de pessimistas, “vendedores do caos”, “velhos do Restelo” e “terroristas informativos”. Como é inexistente a probabilidade de apenas críticos e gente da oposição ter lotado os 70 mil lugares do Mané Garrincha, é melhor a presidente buscar um diagnóstico mais realista para as dificuldades que está enfrentando e para o Brasil que está emergindo.

A chefe da nação recebeu uma vaia sonora, espessa e prolongada por intermináveis dois minutos durante a cerimonia oficial de abertura da Copa das Confederações, em Brasília. Foi todo um manancial represado de insatisfações que se manifestou momentos antes de a seleção brasileira começar a bater a do Japão em campo, jogando um futebol bacaninha. Deve ter doído na presidente tanto quanto um grito de gol comemorado por torcida adversária.

Dilma passara a semana excomungando as críticas que seu governo vem recebendo. Fez isso depois de ouvir do padrinho Lula que deveria “partir para cima” para segurar a curva descendente de sua popularidade e “dar a volta por cima”. Não demorou muito para levar bola nas costas.

A presidente começou suas perorações na quarta-feira, quando, numa cerimonia oficial no Palácio do Planalto, comparou quem não lhe diz amém a um personagem de Camões que, a despeito do oba-oba geral vigente à época, via e apontava riscos nas aventuras ultramarinas e mercantilistas de Portugal.

Continuou na quinta-feira, quando tachou seus críticos de “vendedores do caos”, durante evento com a militância petista em Curitiba. E voltou à carga, no Rio, na sexta-feira, quando afirmou que a situação desconjuntada por que passa nossa economia atualmente é fruto de “estardalhaço e terrorismo informativo” e não de problemas efetivos, como inflação em alta e contas públicas em petição de miséria.

Este pessoal de personalidade doentia e que adora flertar com o caos deve ter corrido para comprar ingressos na última hora para o jogo de estreia da Copa das Confederações e lá despejar, direto na face da presidente, sua noção depauperada das coisas, sua indignação amalucada com um país que vai para frente, sua revolta sem sentido com uma realidade típica de comercial de margarina. Bom, assim deve ter imaginado Dilma…

Se havia, até pouco tempo atrás, uma insatisfação algo difusa com o estado atual das coisas, ela vai agora se tornando mais presente. De algo amorfo, vai se transformando em revolta palpável, sentida e doída na pele. Passagens caras de ônibus acabam servindo para catalisar o descontentamento com anos de catraca livre para a corrupção, de falta de ética, de um vale-tudo pelo poder – em suma, de descompromisso com a população.

Os centavos a mais que detonam protestos são os mesmos que pesam nos preços da comida, da moradia, dos remédios. O desagrado com serviços prestados com má qualidade é o mesmo que orienta o descontentamento com o imposto alto que não reverte em saúde, educação e segurança de qualidade. O bilhete de ônibus tornou-se o passaporte de protestos mais gerais.

Não são meros pessimistas, arautos do caos, derrotistas incorrigíveis os insatisfeitos com o atual estado do país, como quer fazer crer Dilma. São, também, os que veem e anteveem problemas, que tentam alertar antes que o caldo entorne, que prefeririam que tudo estivesse bem para não ter que chegar a vaiar um presidente da República antes de uma partida festiva de futebol. São, enfim, os que prefeririam um Brasil diferente.

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