“Carta aberta a Dilma Rousseff”, por Alberto Goldman


Texto do vice-presidente do PSDB, Alberto Goldman

Cara Dilma,

Você declarou, na festa de 10 anos do PT: “nós não herdamos nada, presidente Lula, nós construímos”. Devo dizer que senti-me, pessoalmente, atingido por tanta insensibilidade e tanto desrespeito.

Sou daqueles que, como milhares de brasileiros, lutou pelas liberdades desde o golpe de 1964 até a redemocratização do país na década de 1980. Você também foi um deles, ainda que de maneira diferente da minha.

Eu, Fernando Henrique e muitos outros entendíamos que somente uma grande frente democrática, usando todos os espaços legais e semi legais possíveis, poderia derrotar o regime. Por isso nos filiamos ao MDB e fomos juntando forças até a vitória da Democracia. Você optou, como muitos, por um caminho equivocado: a luta através dos grupos que acreditavam que seria possível derrubar a ditadura pelas armas. Foi presa, torturada e depois seguiu o mesmo caminho que nós e, quando a democracia foi vitoriosa, se dedicou a organizar o PDT e foi secretaria no governo de Porto Alegre. Posteriormente se filiou ao PT e, após a vitória de Lula, em 2002, passou a ser um seu muito próximo colaborador.

Comecei a minha vida política em 1970, o mesmo ano de sua prisão, como candidato (vitorioso) a Deputado Estadual pelo MDB e, enquanto eu denunciava a ditadura e a repressão na tribuna da Assembleia Legislativa, você, há poucos metros do local, nos porões do DOI-CODI, estava presa e sendo torturada. Dediquei-a a vida não só a reconquistar os direitos usurpados como também a buscar a melhoria das condições de vida de nosso povo. Não enfrentei a prisão, nem fui objeto de torturas, mas sofri, sob riscos e ameaças, durante muitos anos, as agruras de uma luta política que parecia fadada ao insucesso. Fui Deputado Federal, Secretário de Estado, Ministro dos Transportes, Vice Governador e Governador do Estado, sempre coerente com minha origem e minha história. Acreditei ser possível vencer – e vencemos.

Não só reconquistamos a Democracia, como iniciamos a reconstrução de um país paralisado e sujeito à brutal inflação, onde a pobreza e a miséria atingiam a maioria da população. Durante os anos dos governos Sarney, Collor (que derrubamos), Itamar e Fernando Henrique, fomos plantando políticas que sedimentavam o regime democrático e semeavam as esperanças de melhores dias para o nosso povo. Os resultados, pouco a pouco, foram germinando e logo após, Lula com você no seu governo, e agora você mesmo – e nós na oposição – construímos o país que hoje temos.

Como você tem agora a coragem de dizer que não herdaram nada. A nossa luta, o nosso suor, o nosso sangue e as nossas lágrimas foram apenas uma fantasia? Ou um pesadelo? Como você tem a coragem de dizer que vocês, só vocês, é que construíram algo?

Na luta política não se espera muita coisa do adversário. Mas o respeito à verdade histórica e a honestidade intelectual não podem ser desprezadas. Principalmente por parte de você que quando na prisão, e mesmo fora dela, acompanhava a nossa luta, que certamente reconheceu.

Você não tem o direito de se expressar dessa formal. Está na disputa pela reeleição e se compreende que defenda o seu governo, como nós mostramos os seus insucessos. Mas há um limite ético, uma exigência de escrúpulos, mesmo nesse terreno tão sem princípios que tem sido a política. Não macule a sua história, muito menos a nossa, com afirmações que um militante honesto, quanto mais um Chefe de Estado, com o seu passado e as suas responsabilidades, não pode fazer.

Alberto Goldman

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