Brasil isola-se como país que cobra as mais altas taxas do planeta


“Juros jabuticaba”

Como era esperado, o Banco Central aumentou ontem, novamente, os juros básicos. A política monetária jabuticaba manteve sua marcha batida ladeira acima: o Brasil mantém-se como o país que cobra as mais exorbitantes taxas do planeta, na contramão de todo o resto da humanidade.

A Selic foi ontem a 12,5% ao ano, maior patamar desde janeiro de 2009. Neste ano, só subiu. Foram cinco altas consecutivas ao longo do governo Dilma Rousseff – somente na reunião de janeiro o Copom não alterou a taxa. Há quatro meses os juros básicos aumentam; neste ano, acumulam elevação de 1,75 ponto percentual.

Com a decisão tomada ontem pelo Comitê de Política Monetária, o Brasil isolou-se ainda mais na liderança do ranking mundial de juros. Pratica-se hoje no país taxa real, ou seja, descontada a inflação, de 6,8% ao ano.

Para se ter ideia de quão discrepantes estamos do resto do mundo, o segundo colocado na listagem, elaborada pela Cruzeiro do Sul Corretora, é a Hungria. Lá o juro real está em 2,4% ou quase um terço do patamar brasileiro.

Na média das 40 principais economias do mundo, segundo o levantamento da corretora, o juro real é negativo em 0,8%. Deste grupo, apenas nove países praticam juros nominais acima da inflação; nos demais, o custo de tomar dinheiro emprestado é negativo ou igual a zero.

Apenas num curto período, entre março e dezembro de 2009, no auge da crise econômica global, o país perdeu a primeira posição do ranking para a Turquia e a China – que hoje praticam taxas ao nível do chão. Ao longo de todos os anos recentes, o Brasil foi sempre o primeiro colocado.

O Brasil sobe seus juros num momento em que todo o resto do mundo – todo mesmo – corta suas taxas. Estamos na contramão. O problema é que, neste momento, com a inflação ainda fora de controle, não há espaço para cortes.

A oportunidade de dar uma paulada nas taxas foi perdida pelo Banco Central lá atrás, entre 2008 e 2009. Agora fica bem mais difícil agir, sob pena de a estabilidade da moeda ir para o espaço. Como o gasto público não baixa, o país mantém-se atrelado a optar entre juro alto e inflação menor.

Mas o juro básico não vale para todos. Aproximadamente 20% do estoque de crédito concedido no país, quase R$ 370 bilhões, têm como origem o BNDES, em que predomina a referência da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), mantida em 6% ao ano desde 2009. Descontada a inflação, estes empréstimos têm custo negativo para o tomador.

“Esse descasamento configura um subsídio elevado, que pesa sobre o déficit fiscal e sobrecarrega a própria Selic, que tem que ser mais alta para cumprir a tarefa de inibir a pressão exercida pelo consumo, já que seu efeito não alcança uma parte expressiva dos financiamentos concedidos no país”, avalia o Valor Econômico.

Como uma parte dos que tomam dinheiro emprestado pode recorrer aos juros camaradas do BNDES – como os frigoríficos, as companhias telefônicas, as fabricantes de celulose e, se não fosse a grita da sociedade, os supermercados franceses – a maioria das pessoas acaba tendo de arcar com juros muito mais salgados, que têm na Selic um piso distante.

O Valor estima que a concessão de empréstimos baseados na TJLP configura subsídios de pelo menos R$ 7 bilhões ao ano. Não se sabe ao certo o valor, porque tudo corre sob sigilo bancário no BNDES. O correto seria que tais financiamentos passem pelo Congresso, como prevê emenda à LDO de 2012 apresentada pelo senador Aécio Neves e ameaçada de veto pelo Planalto.

A leitura do comunicado de ontem do Copom sugere, segundo parte dos analistas, que o BC dará uma parada no aumento da Selic. Tudo dependerá, dizem, da evolução da conjuntura econômica – algo tão imprevisível no mundo hoje quanto os efeitos do bater de asas de uma borboleta no Brasil nos humores de um elefante na África. No país da jabuticaba, esta frutinha que só existe aqui, ninguém arrisca descartar novas altas das exorbitantes taxas de juros.

Fonte: ITV – Carta de Formulação e Mobilização Política Nº 281.

Este e outros textos analíticos sobre a conjuntura política e econômica estão disponíveis na página do Instituto Teotônio Vilela.

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