O Estado de S.Paulo
Se restava alguma dúvida quanto à credibilidade do Exame
Nacional do Ensino Médio (Enem) e do Sistema de Seleção Unificada
(Sisu), ela foi desfeita depois que a Justiça Federal concedeu liminar
prorrogando por seis dias o prazo de inscrições somente nas
universidades federais situadas no Estado do Rio de Janeiro. Com isso, a
confusão aumentou ainda mais, pois o sistema de informática do
Ministério da Educação (MEC) não está preparado para "isolar" os
estudantes fluminenses. O término das inscrições estava previsto para as
23h59 da última terça-feira e já havia sido prorrogado até o último
minuto de quinta-feira pelo Ministério da Educação.
Além das trapalhadas administrativas e eletrônicas, as inscrições
agora estão marcadas por indefinições e incertezas na área jurídica.
Como a disputa pelas 83.125 vagas oferecidas pelo Sisu envolve um
concurso de amplitude nacional, o adiamento das inscrições somente no
Estado do Rio de Janeiro fere o princípio da isonomia - e isso poderá
levar para o âmbito da Justiça o processo seletivo das 83 universidades
públicas que aceitaram a proposta do MEC de substituir o vestibular
tradicional pelas notas do Enem.
Depois de todas as trapalhadas ocorridas em 2009, esperava-se que o
MEC tivesse tomado as medidas necessárias para evitar que elas se
repetissem. Infelizmente, isso não aconteceu. Entre outros tropeços, o
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) - o órgão
encarregado do Enem e do Sisu - não conseguiu explicar por que
vestibulandos que se inscreveram para determinados cursos de
determinadas instituições tiveram seus nomes registrados em cursos
diferentes oferecidos por outras universidades - com uma distância
superior a mil quilômetros entre elas.
O Inep chegou a reconhecer que o sistema de informática não foi
planejado para atender à demanda, mas afirmou que ele estava imune a
erros e riscos de manipulação. Com cópias de imagens extraídas do site
do MEC, os estudantes desmoralizaram o órgão, mostrando que as opções de
curso realizadas entre a manhã de domingo e a tarde de segunda-feira
foram alteradas entre a terça e a quarta-feira. Além disso, mais uma vez
o Inep não conseguiu evitar o vazamento de informações sigilosas dos
vestibulandos e houve até casos de dados que foram modificados com
nítida má-fé por concorrentes.
O novo fracasso do MEC pode comprometer o início do ano letivo das
instituições que fazem parte do Sisu e pôr em risco o planejamento do
ensino superior público para 2011. Os prazos de inscrição no Fundo de
Financiamento ao Estudante do Ensino Superior e no ProUni, por exemplo,
já tiveram de ser prorrogados.
Como ocorreu em 2009, para aplacar críticas, a cúpula do MEC
substituiu o presidente do Inep. Em pouco mais de um ano, o órgão - que
também é responsável pelo Ideb, pelos censos da educação e pelo Exame
Nacional de Desempenho dos Estudantes - teve três presidentes.
Os dois primeiros assumiram o cargo prometendo resolver as
trapalhadas administrativas na condução do Enem. E a terceira - a
pedagoga Malvina Tuttman -, assim que foi nomeada, esta semana, propôs a
criação de uma Concursobrás - uma estatal para gerir o Enem e fazer
avaliações. A ideia já havia sido discutida pelo MEC com o Ministério do
Planejamento, em 2009, mas não prosperou.
Em vez de cobrar eficiência e corrigir os problemas de gestão da
máquina do MEC, uma das maiores da administração pública federal, a
presidente do Inep - seguindo uma triste tradição do serviço público
brasileiro - quer ampliar ainda mais a burocracia. E isso pode resultar
em mais contratações e gastos, sem qualquer garantia de que sejam
sanadas as deficiências que levaram à desmoralização do Enem.
Na realidade, o desafio não é criar órgãos novos, mas requalificar a
burocracia do MEC, reestruturar o sistema de avaliação desfigurado pelo
último governo e rever o Sisu - esse gigantesco vestibular das
universidades federais que a União não consegue gerir.
É o caso de discutir a possibilidade de voltar ao esquema em que cada
universidade federal tinha autonomia para definir seu vestibular, sem
qualquer interferência dos ineptos burocratas de Brasília.
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