Quando era deputado, o atual vice-prefeito de
São Bernardo do Campo, músico conhecido como “cãozinho dos teclados”,
destinou emendas para evento de promoção do Nordeste promovido por ele
mesmo. Com irregularidades, o evento é um dos que o Ministério do
Turismo exige o dinheiro de volta
Frank Aguiar come acarajé com Marta Suplicy na Mostra Nordeste: Ministério do Turismo quer dinheiro de volta |
Um
ex-deputado forrozeiro conhecido como “cãozinho dos teclados”, um
apresentador de um canal de TV esotérico que se intitula “homem de fé”,
uma feira nordestina em São Paulo, uma verba federal de R$ 2,5 milhões, o
Ministério do Turismo e uma ONG interditada judicialmente. O que une
todos esses personagens é mais uma história de mau uso do dinheiro
público.
O então deputado Frank Aguiar (PTB-SP), hoje vice-prefeito de São
Bernardo do Campo, destinou emenda de R$ 1,4 milhão do orçamento para a
feira Mostra Nordeste Brasil, em São Paulo. Com apoio de outros
parlamentares e do Executivo, o Ministério do Turismo mandou R$ 2,5
milhões para o Instituto Promur realizar o evento. Mas é o cantor de
forró quem idealizou tudo. A Mostra Nordeste é um dos eventos
contestados pelo Ministério do Turismo. Como o Congresso em Foco
noticiou ontem, o ministério está pedindo de volta R$ 68 milhões que
repassou para financiar eventos como festas juninas, desfiles de escola
de samba e até concursos de mulatas.
A prestação de contas do evento promovido por Frank Aguiar foi
considerada irregular. O Ministério do Turismo agora cobra a devolução
de todo o dinheiro repassado ao Promur, que já trocou de presidente três
vezes nos últimos três anos e hoje está fechado.A atual diretoria diz dirigir o instituto às cegas e só graças a uma decisão judicial.
Os R$ 2,5 milhões cobrados de volta fazem parte de uma extensa lista
de convênios inadimplentes levantada pelo site. Como mostrou o Congresso em Foco, o
governo cobra a devolução de R$ 68 milhões destinados a festas e
eventos, por não haver prestações de contas que comprovassem bom uso do
dinheiro público e ausência de corrupção.
Barracas e Calcinha Preta
A Mostra Nordeste Brasil – Turismo, Negócios e Cultura foi idealizada
por Frank. Em 2007, no primeiro ano de seu mandato de deputado federal –
para o qual recebera quase 145 mil votos – ele apresentou emenda ao
orçamento de 2008 destinando recursos para o evento. “Visa a implementar
a divulgação do turismo interno no estado de São Paulo , com a
realização de eventos municipais, no que tange a inclusão social no
aspecto do desenvolvimento turístico”, diz a emenda. A justificativa
consta do espelho da emenda, que mostra como destino do dinheiro o instituto Promur, de São Paulo.
A festa aconteceu em abril de 2008, dois meses antes de Frank ser
indicado como vice na chapa do ministro da Previdência à época, Luiz
Marinho (PT), para concorrer à prefeitura de São Bernardo do Campo, na
região do ABC paulista. A então ministra do Turismo, Marta Suplicy (PT),
que depois concorreria sem sucesso à prefeitura paulistana, era uma das
presentes ao evento com barracas típicas, estandes dos governos dos
estaduais do Nordeste e shows de artistas como Elba Ramalho, Alceu
Valença e a banda Calcinha Preta. O próprio Frank Aguiar apresentou-se
também, mas, segundo ele, sem cobrar cachê.
Em entrevista a uma jornalista durante o evento (como mostra o vídeo
acima), Frank disse que Marta elogiou-o pela iniciativa. A hoje senadora
eleita disse que o deputado era “ousado” pela realização da Mostra
Brasil.
Quem fez a festa foi o Promur, mas o vice-prefeito de São Bernardo
lembra que foi subcontratada a empresa especializada em feiras, GB
Brasil e Negócios. O mais impressionante é que o secretário do
instituto, o advogado José Carlos de Oliveira Rocha, disse ao Congresso em Foco
que participou da feira, mas não lembra qual foi o trabalho feito pela
ONG. “O instituto foi responsável por viabilizar um projeto que existia.
Não sei te informar qual é efetivamente a participação dele”, afirmou
Rocha. “Teve uma participação em termos organizacionais. Deve ter tido
uma.”
Frank Aguiar disse ao site que não conhecia os
representantes do instituto. Mas garante que tudo aconteceu conforme o
combinado. “O evento existiu. Meto a mão no fogo. O que idealizei,
conseguimos mostrar. Fiscalizei a execução do projeto. Tudo o que
pedimos, eles cumpriram”, elogiou.
Frank afirmou que talvez a ONG tenha falhado apenas na prestação de contas. E se ofereceu para ajudar a “acertar as coisas”.
Benefício eleitoral
Questionado sobre o fato de ter destinado emendas orçamentárias de
sua autoria para um evento que ele mesmo produziu, Frank Aguiar diz não
ver nenhum problema. “Por que um nordestino não pode defender sua
região?”, questiona ele. O professor de Direito Constitucional Luiz
Tarcísio Teixeira, porém, não concorda com os argumentos do
vice-prefeito. “É uma questão de benefício eleitoral e de imoralidade”,
afirmou. Para o professor, Frank Aguiar beneficiou-se eleitoralmente do
evento que promoveu. Assim, não poderia ter se valido do poder que tinha
como deputado para destinar verbas públicas para ele.
Frank
Aguiar diz não saber dos problemas ocorridos na prestação de contas da
Mostra Nordeste, que o Ministério do Turismo questiona. Os problemas são
remetidos para o Instituto Promur, que recebeu os recursos para fazer o
evento. Na época, a ONG era presidida pelo empresário Cláudio Gonçalves
Santos, o Cláudio José, apresentador de TV esotérica. De lá para cá, o
instituto foi palco de brigas entre seus membros. Uma divergência entre
os filiados resultou na destituição de Cláudio José. Rocha diz que a
atual diretoria briga na Justiça para ter acesso aos documentos da
gestão anterior. E garante que sequer sabia da cobrança de R$ 2,5
milhões contra o instituto, que não funciona mais e está desativado.
No endereço atual do Instituto Promur, a avenida Leôncio de
Magalhães, número 750, em São Paulo, funciona a TV Mundi – A TV da Nova
Era, especializada em conteúdo esotérico. Os funcionários de Cláudio
José, fundador e apresentador da televisão, disseram que ele estava em
Honduras, e não poderia falar com a reportagem.
Em seu programa, Cláudio José se diz, literalmente, “um homem de fé”. A vinheta do programa é formada pela música “Aleluia”, de Haendel, e por imagens do Cristo Redentor, da esfinge do Egito e de uma deusa hindu.
Em seu programa, Cláudio José se diz, literalmente, “um homem de fé”. A vinheta do programa é formada pela música “Aleluia”, de Haendel, e por imagens do Cristo Redentor, da esfinge do Egito e de uma deusa hindu.
Rocha diz que Cláudio José foi retirado do Promur por “problemas
internos e de relacionamento”. Mas um ex-presidente da ONG, o médico
Edson Miranda Monteiro, diz que as más prestações de contas do instituto
e a realização da feira, patrocinada pelas emendas do deputado Frank
Aguiar, é que causaram os problemas. “Ele tomou várias atitudes que a
gente não concordou e movemos uma ação para tirá-lo do instituto”, conta
Monteiro. “Até por conta dessa feira aí, que eu não tenho dados
concretos. Não houve muito boas prestações de contas. Ele responde por
esse evento, essa Mostra Nordeste.”
Fonte: Edson Sardinha e Eduardo Militão - congressoemfoco
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