Foi apenas o fechar das
urnas, e as verdades começaram a aparecer. A CPMF reaparece com a
presidente eleita e alguns governadores falando dela com uma sinceridade
que lhes faltou na campanha.
O governador do Rio entrou no STF
dizendo que o sistema de partilha do petróleo prejudica o estado. O
sistema é ideia de Dilma Rousseff, a quem Sérgio Cabral deu seu
entusiasmado apoio.
Tenham compostura senhores e senhoras da
política: nós não somos bobos. Quantas vezes vocês acham que podem nos
enganar mudando de tom, discurso e propósitos entre o pré e o pós-urnas?
O
banco PanAmericano estava quebrado antes das eleições, mas as
informações sobre isso apareceram apenas alguns dias depois. O que torna
o caso inegavelmente uma questão de interesse e dinheiro públicos é a
compra extemporânea de 49% do banco pela Caixa Econômica Federal e a
cegueira coletiva que atingiu comprador e fiscalizadores.
PT e
PMDB, os dois maiores partidos da coalizão, começaram a se engalfinhar
em público pelos cargos, como se fosse uma disputa do butim de uma
batalha que eles venceram. Fica-se sabendo que o consumidor — e não as
empresas como Itaipu e Furnas — é que pagará pelo custo do apagão que em
2009 deixou 18 estados sem luz.
Nove empresas receberam multas de
R$ 61,9 milhões e recorreram. Ainda nenhum tostão saiu do caixa delas.
Mas o distinto público que ficou sem luz pagará R$ 850 milhões a mais em
suas contas em 2011.
O TCU informa que 32 obras de investimento
do governo, 18 delas do PAC, deveriam ser paralisadas porque têm graves
irregularidades e sobrepreço. Entre elas, algumas que foram exibidas na
propaganda eleitoral da presidente eleita, como a Refinaria Abreu e
Lima.
O financiamento do trem-bala não terá apenas dinheiro
subsidiado, terá subsídio direto de R$ 5 bi nos primeiros anos. A lista
das más notícias neste breve período pós-eleitoral é grande e está em
várias áreas; em comum o fato de terem sido dadas em momento muito
conveniente para o governo.
O governador do Rio, Sérgio Cabral,
não pode alegar que desconhecia que o sistema de partilha, as mudanças
na Lei do Petróleo e as condições da capitalização da Petrobras
prejudicam frontalmente o estado que governa. Ele até chorou por isso,
em público, meses antes das eleições. Depois, tratou a questão como
resolvida.
O prejuízo teria sido evitado por um suposto e mal
explicado acordo entre ele e seus aliados do governo Federal. A nova
regulação do petróleo, que foi toda formatada no gabinete da então
ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff — hoje presidente eleita —,
prejudica o Rio. O estado que produz 80% do petróleo que se extrai no
Brasil e que será também grande no pré-sal perde porque no sistema de
concessão o estado recebe royalties e participação especial.
No
novo sistema não há participação especial e ainda há o risco de se
perder grande parte dos royalties. Perde também porque a União fez a
transferência para a Petrobras, na chamada cessão onerosa, de bilhões de
barris de petróleo do pré-sal que também não pagarão participação
especial ao Rio.
Disso tudo o governador Sérgio Cabral sabia antes
e durante o processo eleitoral. Por que nunca disse isso ao eleitor?
Por que deixa para entrar no Supremo Tribunal Federal depois das
eleições? Um governador tem que ter como primeira lealdade a defesa dos
interesses do estado que administra e não a coalizão política da qual
participa.
O advogado-geral da União, Luís Adams, disse que vai
contestar a Ação Direta de Inconstitucionalidade do Rio. "Não vejo
futuro nessa Adin", disse Adams. Pois é. O que ela tem é passado: o
tempo em que o governo do Rio esperou para entrar com a ação.
A
declaração da presidente Dilma em sua primeira entrevista de que não
poderia ignorar a pressão dos governadores pela CPMF — assim, docemente
constrangida a defender o imposto — foi espantosa.
Primeiro,
porque ela nunca deu ciência aos eleitores de que estava sendo
pressionada; segundo, porque os governadores disputando eleição ou
reeleição também não disseram que estavam pressionando quem quer que
seja pelo imposto. Terceiro, porque a arrecadação aumentou depois do fim
do imposto pelo peso da elevação de outros tributos.
O P da CPMF
quer dizer provisório. Foi criada em momento específico e com objetivo
limitado. Era para atravessar o período da transição entre a
hiperinflação e a estabilidade, quando havia risco de uma queda da
arrecadação. Ela cria muitas distorções. Parece prejudicar apenas quem
faz transações bancárias mas afeta, em cascata, todos os preços da
economia. Por ser cumulativa, vai produzindo um peso enorme sobre as
empresas, que o transferem ao consumidor. Aí o imposto fica regressivo,
injustamente distribuído.
Os governadores e os presidentes, eleita
e em exercício, podem estar sinceramente convencidos de que sem a CPMF
não é possível financiar a saúde — ainda que, como se sabe, ela pouco
financiou a saúde — mas só poderiam tratar disso agora se tivessem
defendido o imposto durante o processo eleitoral.
O Brasil tem um
longo histórico de verdades ocultas durante o período em que
encantadores candidatos tentam atrair o voto do cidadão pintando o mundo
de cor-de-rosa e prometendo só alegrias. Por isso a CPMF é inaceitável.
Só pode propor o imposto agora quem teve a coragem de defendê-lo quando
estava no palanque.
Fonte: O Globo
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