Mauro Ricardo, secretário da Fazenda do Estado de São Paulo
Para Mauro Ricardo, a discussão é "um problema gravíssimo, de médio e
longo prazo". Sem citar quanto deixará em caixa para o governador
eleito, Geraldo Alckmin (PSDB), Ricardo diz que a gestão em São Paulo,
governado pelos tucanos desde 1995, é uma "corrida de revezamento com
obstáculos": os que entram terão de cumprir novas etapas, como a
instituição do fundo de previdência complementar dos servidores.
Quais medidas que o governo Serra/Goldman deixará pendente para a próxima gestão?
Desde a época do Covas, a gente vem numa corrida de revezamento com
obstáculos. Governos anteriores passaram por vários obstáculos, cada um
de acordo com a conjuntura econômica da época. Tínhamos no Instituto de
Previdência do Estado de São Paulo problemas em relação à administração,
por exemplo, de duas carteiras extremamente deficitárias, carteiras que
tinham um déficit atuarial de algo em torno de R$ 20 bilhões. Hoje,
temos duas carteiras de serventias e advogados que estão equilibradas,
sem qualquer possibilidade de onerar o Tesouro estadual. Criamos também a
São Paulo Previdência, em 2007, e unificamos a legislação em relação à
questão.
Mas ficarão pendências na área para a próxima gestão.
Temos ainda um déficit do sistema do Regime Próprio de Previdência
dos Servidores que monta em R$ 200 bilhões. Anualmente gera déficit de
R$ 7 bilhões. O desafio é equacionar ou reduzir este déficit de tal
forma que não comprometa a capacidade de investimento do Estado. Hoje há
permissibilidade constitucional de estabelecer um regime próprio de um
fundo de previdência complementar para os novos servidores, e é isso que
deve ser implantado. Aí tem uma lei estadual implantando o fundo de
previdência complementar. Você estanca o crescimento, porque os novos
servidores já entrarão no fundo de previdência complementar.
E mudança no sistema atual?
Aí não tem condição de mexer, a não ser com reforma constitucional.
Melhor mexer nos que vão entrar, para não aumentar o déficit.
Por que a gestão atual não avançou nisso?
Acho que são os desafios que tem pela frente. São vários obstáculos.
Não dá para pular todos ao mesmo tempo. Não dá para fazer tudo de uma
vez só. O próximo vai fazer.
A substituição tributária, implantada pelo sr., causou desgaste para o governo.
Teve mais reação porque é uma ação forte de combate à sonegação,
principalmente no varejo. Isso nos dá anualmente receita adicional de R$
2,5 bilhões. Desde a implantação, nos deu R$ 5 bilhões, sem aumento de
carga tributária. Só aumentou a carga para aquele que não pagava. Vamos
deixar a arrecadação em outro patamar, com a Nota Fiscal Paulista.
Estamos deixando um orçamento no ano que vem de R$ 140,7 bilhões. Quando
entrei era de R$ 98 bilhões. Conseguimos autorizações para operações de
crédito. A última autorização foi em 1997. De 2007 a 2010, R$ 15
bilhões de autorização para novas operações. Fizemos 6 concessões,
gerando R$ 5,5 bilhões em outorga e R$ 8,8 bilhões de investimentos
privados.
A discussão sobre privatizações ficou eclipsada no debate eleitoral. Quais ativos o próximo governo poderá privatizar?
Colocamos no orçamento de 2011 duas alienações que estamos
trabalhando em 2010. A primeira é a alienação de recebíveis do programa
de parcelamento incentivado que fizemos. A outra são alienações de
recebíveis de concessões da Autoban. Essas duas antecipações renderiam
líquido R$ 1 bilhão.
Quanto será deixado em caixa para Alckmin?
Ficarão os recursos necessários para pagar despesas não pagas.
Que serão de quanto?
Nós vamos arrecadar todos os recursos necessários para pagar todos os
compromissos. Alguns serão pagos este ano, outros ficarão para o ano
que vem, porém os recursos estarão em caixa.
Contratos de concessão também devem ser renegociados?
Alguns contratos foram feitos lá atrás, em outro contexto econômico. Não sei se juridicamente isso pode ser feito.
Alckmin se manifestou a favor da renegociação da dívida.
Isso de fato é um problema, porque você tem uma dívida que hoje chega
a quase R$ 160 bilhões com o Tesouro Nacional. Uma dívida que está
contratada com o IGP-DI, com juros de mais 6% ao ano. Só que a situação
econômica do Brasil mudou e hoje estamos pagando mais que a taxa de
juros da Selic. É algo que penaliza bastante. Aplicando isso ao estoque
da dívida, você está aumentando significativamente o estoque da dívida. A
prestação é limitada a 13% da receita corrente líquida. Não é
suficiente para pagar os juros. Esse estoque vai crescendo de tal
maneira que, ao final do contrato, em 2027, teremos um resíduo enorme a
ser pago. Vai ser refinanciado por 10 anos, sem limite mais para
pagamento de prestação mensal. Isso pode comprometer 40% das receitas do
Estado. É um problema gravíssimo, de médio e longo prazo. As pessoas
precisam despertar seriamente para essa discussão. É isso que o Geraldo
Alckmin tem falado e é isso que espero que o governo federal se
conscientize.
O sr. vê espaço no novo governo para essa discussão?
Vai depender da capacidade de mobilização dos governadores de colocar
este assunto na pauta. Senão este problema, em 2027, vai inviabilizar o
governo. Acho que tem de discutir indexador, juros e prazo. Ninguém
quer dar calote na dívida. São Paulo paga corretamente sua dívida, paga
R$ 9 bilhões por ano, não está propondo diminuir o valor que paga. Só
que o estoque da dívida entre numa trajetória que seja possível quitar
ao final.
Os novos governadores pretendem fazer uma discussão em torno do ressarcimento das perdas com a Lei Kandir.
É trágica a situação que a gente vem passando há vários anos. Pela
segunda vez, o governo federal coloca na proposta orçamentária zero. A
gente pensa: qual a prioridade que quer dar às exportações. Os Estados
perdem por ano R$ 22 bilhões, São Paulo perde R$ 4,8 bilhões. E recebe
do governo federal de ressarcimento R$ 800 milhões. Estive com Nelson
Machado (secretário executivo do Ministério da Fazenda) na semana
passada. Estou chateado. Botar gente pra ir negociar no Congresso.
Deveria ser obrigação deles colocar o dinheiro, obrigação
constitucional. Daí você vai disputar no Congresso com discussão de
salário mínimo, de emenda parlamentar. É inadequado fazer os Estados
passarem por isso.
Serra assumiu em 2007 assinando decretos que passavam um pente fino na administração anterior, que era do Alckmin.
Cortamos em torno de 15% dos cargos, na gestão toda, direta e
indireta. Gerou economia de R$ 78 milhões anual. Foram cortados 4.440
cargos aproximadamente. Fizemos reavaliação de todos os contratos e
licitações em vigor. Conseguimos uma redução de R$ 600 milhões nos
contratos renegociados.
Fonte: Julia Duailibi - O Estado de S.Paulo
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