Se havia alguma dúvida sobre a capacidade do Ministério
da Educação (MEC) de recuperar a imagem do Exame Nacional do Ensino
Médio (Enem) e evitar que sua desmoralização comprometesse todo o
sistema de avaliação escolar, ela foi desfeita nesse fim de semana com a
prova aplicada a cerca de 3,4 milhões de estudantes. Além de avaliar a
qualidade do ensino médio, o Enem é usado como processo seletivo para
muitas instituições públicas de ensino superior - principalmente as
universidades federais.
Dessa vez os problemas decorreram de falhas de montagem de um dos
cadernos da prova, o que levou os estudantes a se deparar com textos
repetitivos e falta de questões. Além disso, os cartões de resposta
foram impressos de forma invertida - fato que não foi comunicado à
maioria dos candidatos. No sábado, o Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais (Inep), o mesmo que fracassou na organização do
Enem de 2009, divulgou que quem foi induzido a erro, no preenchimento do
cartão, poderá solicitar que a prova seja corrigida "ao contrário".
Isso dá a medida da inépcia administrativa do MEC.
Por um balanço extraoficial, os problemas ocorridos com o Enem
envolveram 20 mil provas. Mas, segundo o reitor da Universidade de
Brasília, José Geraldo de Souza Jr., o número de provas impressas com
falhas seria de 30 mil. A instituição foi encarregada, juntamente com a
Fundação Cesgranrio, de preparar as questões.
Embora as autoridades educacionais tenham afirmado que nenhum aluno
será prejudicado, nem o Inep nem o MEC sabem ainda qual é a extensão das
falhas ocorridas e de que modo elas poderão ser corrigidas. A aplicação
da prova foi classificada como um "desastre" pela OAB. O Ministério
Público Federal anunciou que poderá ingressar com ação judicial pedindo a
anulação do exame. A Defensoria Pública da União anunciou que tomará
iniciativa semelhante. No Ceará, a Justiça Federal concedeu liminar
determinando a suspensão imediata do Enem. E a Associação Nacional das
Instituições Federais de Ensino Superior reconheceu que a insegurança
jurídica acarretará para as universidades problemas ainda mais graves do
que os criados pelo Enem de 2009.
No ano passado, os problemas começaram quando se constatou que o MEC
não dispunha de infraestrutura adequada para fazer inscrições pela
internet. Em seguida, o Inep determinou que vários estudantes deveriam
prestar o exame em colégios situados a mais de 300 quilômetros das
escolas em que estavam matriculados. Depois, a prova vazou dois dias
antes de sua realização, deixando claro que as autoridades educacionais
não haviam tomado as medidas de segurança necessárias. Isso as obrigou a
preparar um novo teste às pressas, a um custo superior a R$ 30 milhões,
e aplicá-lo dois meses após a data prevista, o que desorganizou o
calendário das universidades. Na sequência de confusões, constatou-se
que várias questões da nova prova tinham viés ideológico. E, no dia em
que ela foi aplicada, o MEC divulgou o gabarito errado.
Em 2010, as dificuldades começaram com falhas de logística e
amadorismo no planejamento, o que levou à substituição do presidente do
Inep. Em seguida, descobriu-se que os dados pessoais dos candidatos às
três últimas edições do Enem tinham vazado. Com isso, informações que
deveriam ser mantidas em sigilo foram expostas no site do Inep com
acesso livre. Depois o MEC se atrapalhou na escolha dos órgãos
responsáveis pela formulação das questões, o que acabou criando
problemas para a licitação da gráfica e atrasando a contratação de cerca
de 300 mil pessoas, entre coordenadores, aplicadores e profissionais
encarregados da correção.
Esse é o quadro, descrito com o máximo de objetividade, da
desmoralização do Enem. Mas o principal responsável por ele não parece
preocupado. Muito pelo contrário. De fato, o presidente do Inep, José
Joaquim Soares Neto, dizendo-se "orgulhoso" pela aplicação do Enem,
considera que "não houve problemas graves".
Apreciação sobre a qual os alunos prejudicados teriam muito a opinar...
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