A briga dos Estados e municípios por mais dinheiro atingirá níveis
inéditos em 2011. Quatro temas na agenda legislativa que envolvem
mudanças na distribuição de dinheiro público estarão em debate:
distribuição dos royalties do petróleo, reforma tributária, Lei Kandir e
revisão dos índices dos Fundos de Participação.
Ed Ferreira/AE-17/8/2010
Embate. Mudanças no repasse de verbas serão negociadas no Congresso a partir de março
Dependendo de como for conduzido, o debate pode cair no impasse de
sempre. Se o governo tiver sucesso em suas ambições, Estados e
municípios mais pobres terão mais recursos sem que as áreas mais
desenvolvidas percam dinheiro. É certo, porém, que haverá mais pressões
sobre o cofre federal, para contrariedade da presidente eleita, Dilma
Rousseff, que gostaria de aumentar os investimentos.
Lei Kandir. O tema mais imediato é a articulação dos governadores por
R$ 7,2 bilhões referentes à Lei Kandir. Essa lei isentou do Imposto
sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) as exportações de
produtos básicos e semielaborados. Como a medida trazia perdas aos
cofres estaduais, a União concordou em compensá-las até 2002, prazo
depois estendido até 2006. Agora, mesmo sem lei, os Estados continuam
pressionando por dinheiro.
A tendência é que o governo federal inclua no Orçamento de 2011 os
mesmos R$ 3,9 bilhões pagos este ano. "É difícil ser mais do que isso",
disse o deputado Walter Pinheiro (PT-BA), eleito senador e cotado para
ocupar algum posto de destaque no Executivo ou no Legislativo em 2011.
"Mas podemos negociar alguma alteração depois de março." Março é o mês
em que o Congresso começa efetivamente a funcionar, depois de definida a
ocupação dos postos-chave na Câmara e no Senado.
Royalties. Na cabeça dos estrategistas do governo, a Lei Kandir é um
tema menor na agenda de relacionamento com os Estados em 2011. O grande
trunfo nas mãos da presidente eleita, Dilma Rousseff, é a distribuição
dos royalties do petróleo, um bolo estimado em R$ 50 bilhões.
A ideia é partilhar esse dinheiro com todo o País, e não só entre os
Estados e municípios produtores, como é hoje. As áreas mais pobres
tendem a ser mais beneficiadas, de forma a reduzir as desigualdades
regionais.
Um assessor palaciano acha que, mal comparando, o dinheiro do
petróleo fará com as prefeituras e Estados o que o governo Lula fez com
as famílias: um grande contingente sairá da pobreza, sem que os mais
ricos sejam prejudicados.
Na distribuição dessa riqueza, a discussão não é em relação a quem
ganha e quem perde, e sim quem ganha mais ou deixa de ganhar. Não há
perda.
"Entendemos que não dá para se mexer em receitas que já se têm, que
os Estados já incorporaram às suas contas", disse o governador reeleito
de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). "Mas é impossível pensar que os
royalties vão ser apropriados só por alguns."
Se o dinheiro do petróleo for capaz de criar um clima positivo de
negociação com os governadores, Dilma terá uma oportunidade de ouro de
destravar a reforma tributária. Sem mudar o ICMS, ela não conseguirá
cumprir sua promessa de desonerar os investimentos. Tampouco será
possível resolver o problema dos créditos acumulados pelos exportadores,
um fator que agrava a perda de competitividade dos produtos
brasileiros, já prejudicados pelo dólar barato.
"Dedo na ferida". Mas, ao contrário do pré-sal, a reforma tributária
imporá perdas de arrecadação para algumas unidades da Federação. "Se os
Estados querem ajuda, vão ter de colocar o dedo na ferida", comentou
Pinheiro.
Eduardo Campos acha que os políticos estão devendo à sociedade uma
reforma tributária e que o atual período de crescimento econômico é
propício a essa agenda. "O primeiro ano de governo é o momento certo
para esse debate", adicionou o secretário de Finanças do Sergipe, João
Andrade.
Fundos. O ideal, do ponto de vista dos técnicos, seria conjugar as
duas discussões. Assim, eventuais perdas com reforma tributária poderiam
ser contrabalançadas com uma distribuição mais generosa dos royalties.
No entanto, há dúvidas se isso seria viável do ponto de vista político.
Na reforma tributária proposta por Lula, as perdas dos Estados seriam
compensadas com recursos da União.
É também dos cofres federais que poderão sair recursos para
viabilizar uma nova distribuição dos recursos dos Fundos de Participação
dos Estados (FPE). Da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto
sobre Produtos Industrializados (IPI), 22,5% são divididos com governos
estaduais. Os critérios do FPE, porém, foram questionados no Supremo
Tribunal Federal (STF) por um conjunto de Estados e a corte deu prazo
para uma nova definição até o final de 2012.
João Andrade faz parte de um grupo de trabalho que elabora uma
proposta de novos critérios para o FPE. Com a nova distribuição, alguns
Estados terão perdas, que poderiam ser compensadas pela União, segundo
explicou. Pela proposta em estudo, o governo federal teria ainda outra
contribuição a dar. "A União vem batendo recordes de arrecadação com
base em receitas que não são partilhadas", disse. "É preciso ampliar a
base da partilha."
Fonte: Lu Aiko Otta - O Estado de S.Paulo
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