O tema não foi tocado nem de leve em toda a campanha
eleitoral. Aliás, tirando o presidente Luiz Inácio da Silva, nunca mais,
desde dezembro de 2007, se ouviu ninguém alimentar nostalgia pelo
imposto do cheque.
Nem os governadores falaram mais no assunto e isso inclui os agora
reeleitos, os eleitos e os que eram senadores à época da derrubada da
CPMF e muito contribuíram para o resultado de uma votação que até hoje
deixa o presidente Lula inconformado.
A tal ponto que ele foi "caçar" um a um os senadores oposicionistas
nessa eleição, dedicando-se com empenho pessoal e especial a lhes impor
derrotas. Saiu-se bem em alguns casos, em outros fracassou.
Convém recordar que a derrota na votação da renovação da CPMF no
Senado enterrou o projeto do terceiro mandato, pois ali ficou claro que
se passasse pelos deputados, pelos senadores não passaria. Portanto,
aquela não foi uma derrota qualquer.
Foi uma derrota política surpreendente e definitiva.
A história contada pela presidente eleita de que não poderá se furtar
a uma discussão levantada pelos governadores parece conto da
Carochinha. De uma hora para outra, sem mais nem menos, os governadores -
note-se, de partidos aliados ao governo - resolveram considerar a volta
da CPMF uma urgência urgentíssima?
Um desses governadores, Renato Casagrande, do Espírito Santo, foi um
dos mais combativos senadores na derrubada do imposto há três anos.
Dilma, quando candidata, negou intenção de recuperar o imposto. Compreende-se, dada a impopularidade do tema.
Então, nem bem é eleita Lula a chama com urgência ao Planalto - tanta
que ela já estava com as malas no carro para sair em viagem - para uma
entrevista coletiva em que o assunto de maior destaque é justamente a
demanda dos governadores do PT e do PSB.
Não é necessário exercício muito elaborado de observação e dedução
para perceber de quem é a ideia de pôr a CPMF de volta na agenda e
tentar uma revanche logo no início do mandato para aproveitar a boa
vontade geral com a presidente que entra e testar a força do novo
Congresso de maioria governista folgada.
Seria uma bela vitória para a estreante nas lides
político-palacianas. Os governadores, até de partidos de oposição, não
teriam constrangimento algum em aderir, como de resto os politicamente
fiéis não estão encontrando dificuldades para aparecer na cena como
autores do plano.
Com a ampla maioria agora também no Senado, em tese não seria
impossível pensar que o imposto do cheque passasse pelo Congresso.
Enfrentaria, no entanto, obstáculos difíceis de serem transpostos,
exatamente por causa da amplitude, heterogeneidade e voracidade da
"base". Dilma Rousseff precisaria administrar um problema de altíssima
monta logo na estreia.
Sozinha ainda não reúne experiência para tal. Com o antecessor
manejando os cordéis? Não combina com a promessa de Lula de cumprir uma
quarentena.
Há também aquele outro problema chamado opinião pública. Em 2007
houve uma mobilização forte que inicialmente não foi dos partidos, DEM e
PSDB.
Eles embarcaram na onda da campanha deflagrada pelo setor produtivo e
conseguiram capitalizar a insatisfação da sociedade somada a
contrariedades na base parlamentar governista e à displicência da
articulação política.
No ano seguinte o governo tentou retomar o assunto mudando o imposto
de nome e, depois, no ano passado, fez um novo ensaio. Não deu certo.
Desta vez pode ser que dê, exatamente porque a correlação de forças
está ainda mais favorável ao governo e há Lula solto para poder
articular.
Seria, porém, o caso de se fazer a conta se para a presidente Dilma
seria um bom negócio comprar uma briga desse tamanho com a opinião
pública e o empresariado logo aos primeiros acordes da sua sinfonia.
A conferir. O tempo dirá: Lula afirma que não vai interferir no
governo de Dilma, que reza pela cartilha do "rei morto, rei posto", que
vai se recolher deixando a cena ao comando exclusivo da presidente e que
só dará palpite quando solicitado.
Isso se nada do que ela fizer contrariar os planos dele.
Fonte: Dora Kramer - O Estado de S.Paulo
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