O Estado de S.Paulo
Depois da "maior capitalização da história", a maior
empresa do Brasil, a Petrobrás, perdeu R$ 28,4 bilhões de valor de
mercado em apenas três dias, encolhendo 7,5% nesse período. Na
sexta-feira, suas ações ganharam algum impulso, depois de bater no nível
mais baixo em um ano e meio. A onda de vendas foi apenas um "ajuste de
carteira", segundo seu presidente, José Sérgio Gabrielli. "É normal as
ações subirem e descerem", ponderou o ministro da Fazenda e presidente
do conselho da estatal, Guido Mantega. A empresa, acrescentou, está mais
forte do que nunca e sua capitalização foi "reconhecida mundialmente
como importante". Nenhuma das duas explicações é para ser levada a
sério. Oscilações dessa amplitude não são normais no dia a dia nem são
meros ajustes de carteira. O problema da Petrobrás é o mesmo de antes da
capitalização: uma perigosa subordinação aos interesses políticos de um
governo centralizador e voluntarista.
Os investidores foram confrontados durante a semana com duas
novidades importantes. Uma delas foi a avaliação negativa divulgada por
seis bancos. Diluição de lucros e perspectiva de baixo retorno foram os
problemas apontados. A outra foi o rumor sobre irregularidades na
administração da empresa.
Este segundo fator seria muito menos importante, se o mercado
reconhecesse a gestão da Petrobrás como essencialmente profissional e
voltada para objetivos empresariais. Mas esse não é o caso. Há meses, o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou publicamente haver mandado
a estatal investir em refinarias no Nordeste. Esses investimentos,
segundo ele, não teriam ocorrido, se a decisão dependesse da avaliação
dos diretores da companhia. Nos últimos dias, o presidente da República
voltou a alardear sua intervenção.
A Petrobrás, disse ele na quinta-feira, deixou de ser uma caixa-preta
e converteu-se numa caixa branca, ou quase, durante seu governo. Ele
teria apontado um fato positivo, se mencionasse apenas o aumento da
transparência - discutível, na verdade. Mas foi além disso e se
vangloriou, mais uma vez, de mandar na empresa: "A gente sabe o que
acontece lá dentro e a gente decide muitas das coisas que ela vai
fazer."
"A gente decide" é mais que uma expressão singela. É uma confirmação -
mais uma - do estilo centralizador e voluntarista do presidente da
República. Não só de um estilo, mas de uma mentalidade. Ele age e fala
como se as diretorias das estatais fossem apenas extensões de seu
gabinete e não tivessem compromissos com milhões de acionistas. "A gente
sabe" e "a gente decide". Ele, de fato, foi além disso. Tentou
interferir também na gestão de grandes empresas privatizadas, como a
Embraer e a Vale, como se coubesse ao presidente da República orientar
as políticas de pessoal e de investimentos dessas companhias.
Esse jogo de interferências não tem sido apenas econômico e
administrativo. O envolvimento do presidente da República tem sido
sobretudo político e, muitas vezes, político-eleitoral. "A Petrobrás
também está no segundo turno", disse Adriano Pires, diretor do Centro
Brasileiro de Infraestrutura, ao comentar a inauguração antecipada, na
quinta-feira, da Plataforma P-57. Antes da votação de domingo, o evento
estava previsto para dezembro.
Também a capitalização da Petrobrás foi politizada, o que complicou o
processo. O leilão ocorreu quase no fim do prazo previsto, porque o
governo foi incapaz de cuidar do problema com critérios essencialmente
econômicos e administrativos. Sua insistência em ampliar a participação
do Estado na Petrobrás dificultou a fixação do preço dos 5 bilhões de
barris cedidos à empresa pela União. O preço médio foi estabelecido,
afinal, por um processo nunca explicado de forma satisfatória, até
porque não passa de suposição o volume das jazidas envolvidas no
negócio.
A confusão e a insegurança criadas por esse processo politizado
afetaram duramente o mercado. O valor da Petrobrás encolheu cerca de
30%, enquanto a empresa, o governo e a Agência Nacional do Petróleo se
enrolavam nas dificuldades políticas da capitalização. A empresa
continua sob os efeitos de uma gestão politizada e, por isso, vulnerável
a rumores e escândalos. O mercado refletiu, nos últimos dias, essa
vulnerabilidade.
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