Uma faceta da verdadeira Dilma Rousseff, que sua
propaganda eleitoral tem escondido dos eleitores, se revelou numa
entrevista dada em Porto Alegre há alguns dias, que, em artigo publicado
sexta-feira no Estado, o economista Rogério Werneck considerou um
desabafo "desoladoramente esclarecedor", mas cuja repercussão não
correspondeu à sua importância.
A candidata governista à Presidência tem uma visão sobre a gestão do
dinheiro público que deveria preocupar os eleitores-contribuintes. "O
papo de ajuste fiscal é a coisa mais atrasada que tem. Não se faz ajuste
fiscal porque se acha bonito. Faz porque precisa. E eu quero saber: com
a inflação sob controle, com a dívida pública caindo e com a economia
crescendo, vou fazer ajuste para contentar a quem? Quem ganha com isso? O
povo não ganha", afirmou Dilma, de acordo com reportagem do jornal O
Globo.
Na visão da candidata petista, ações de ajuste fiscal sempre vieram
acompanhadas "dos maiores aumentos tributários" e de medidas de gestão
de caixa, como cortes lineares de gastos e atraso na devolução de
créditos tributários, que provocaram a redução dos investimentos em
infraestrutura, saneamento, habitação, etc.
Não é de hoje que Dilma Rousseff se irrita quando ouve falar em
necessidade de ajuste de longo prazo da estrutura de despesas do
governo, para evitar o crescimento do déficit público, sem que, para
isso, seja necessário aumentar a carga tributária, como ela tem
aumentado ao longo da gestão do PT.
Há cinco anos, quando os ministros da Fazenda, Antonio Palocci, e do
Planejamento, Paulo Bernardo (que continua no cargo), apresentaram um
plano de longo prazo que garantiria a redução progressiva do déficit
nominal, até sua eliminação, e da dívida pública, por meio do controle
mais rigoroso das despesas - pois isso era necessário para assegurar a
credibilidade da política fiscal do governo Lula -, Dilma, então
ocupando a chefia da Casa Civil, tratou de desmontar com truculência a
iniciativa de seus companheiros de governo. Em entrevista ao Estado,
considerou o plano "rudimentar" e disse que "o debate é absolutamente
desqualificado".
Depois disso, mudou o vocabulário - ajuste fiscal virou "coisa atrasada" -, mas não sua visão. Pior para o contribuinte.
Como mostrou Rogério Werneck no artigo citado, Dilma não consegue
entender que, no atual regime fiscal, os gastos crescem mais do que o
PIB. As contas públicas só fecham graças ao aumento contínuo da carga
tributária. Se esse regime não mudar, por meio de um ajuste fiscal
profundo que tanto desagrada à candidata petista, os contribuintes
estarão condenados a pagar cada vez mais impostos - até um momento em
que esse método se tornará insuportável - ou a dívida pública crescerá
de tal modo que trará de volta todos os problemas que o País enfrentou
até a primeira metade da década passada.
Dilma tem apontado para a queda constante da dívida pública em
relação ao PIB como prova da eficácia do atual regime fiscal. Mas, além
de omitir o contínuo aumento da carga tributária que sustenta esse
regime, ignora também o fato de que, por meio de artimanhas contábeis, o
governo desviou para o BNDES dinheiro proveniente da emissão de dívida
do Tesouro sem que esse dinheiro fosse contabilizado na dívida líquida
da União.
O aumento contínuo dos gastos públicos, sobretudo com o custeio da
máquina, alimenta a demanda e impõe uma sobrecarga extra à política
monetária na contenção das pressões inflacionárias, ou seja, exige juros
mais altos. Se reduzisse os gastos, o governo abriria espaço para um
alívio na política monetária.
Por fim, a manutenção do crescimento acelerado da economia exige o
aumento da poupança interna, e as contas nacionais revelam que quem mais
pode aumentar a poupança é o governo. Ou seja, se gastar menos com
custeio, o governo pode aumentar sua margem para investir, pois ajuste
fiscal, ao contrário do que supõe a candidata do PT, não significa corte
de investimentos.
Em resumo, como observou Werneck, em matéria de ajuste fiscal, de
Dilma pode-se dizer o que se disse dos Bourbons: nada aprendeu e nada
esqueceu.
Fonte: O Estado de S.Paulo
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