O governo e suas empresas poderão gastar mais e evitar o
controle do Tribunal de Contas da União (TCU), em 2011, protegidos por
dispositivos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), sancionada nesta
semana pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Essa lei determina as
metas fiscais para o ano seguinte, as prioridades e as linhas básicas do
Orçamento federal. O Executivo deve mandar o projeto do orçamento ao
Congresso até o fim deste mês.
A LDO abre duas grandes brechas para o governo e as estatais
escaparem da fiscalização e facilita o uso de uma terceira via de fuga.
O governo havia tentado limitar a certos tipos de projetos a
aplicação das tabelas oficiais de custos e índices de construção civil e
de rodovias, deixando livres da exigência a Petrobrás e a Eletrobrás. O
TCU resistiu, a manobra foi denunciada, mas a bancada governista ganhou
a parada. Um dispositivo introduzido no projeto isenta do controle as
operações não classificadas como obras civis e dá ampla liberdade à
Petrobrás e à Eletrobrás na elaboração de seus contratos.
As duas empresas foram especificadas pelo autor da emenda, o
deputado Gilmar Machado (PT-MG), num comentário sobre sua façanha. A
manobra teve, portanto, o objetivo bem definido de reduzir o controle
público sobre a administração de duas grandes estatais envolvidas em
projetos bilionários.
O governo também poderá escapar dos rigores da Lei de Licitações, na
execução de obras pelo regime de empreitada. Houve polêmica sobre o
assunto durante a tramitação do projeto da LDO, mas a pretensão do
Executivo prevaleceu também nesse caso. O regime de empreitada poderá
ser adotado em obras para a Copa do Mundo e para os Jogos Olímpicos.
O Executivo tentou, com êxito parcial, subtrair do Congresso o
direito de interromper a execução de obras quando há indícios de
irregularidades graves. As irregularidades são apontadas pelo TCU, órgão
de assessoria do Legislativo.
O governo sustentou sua pretensão num argumento usado muitas vezes
pelo presidente Lula: a interrupção de projetos pode ter um grande custo
econômico e social. O presidente já chegou a defender a fiscalização
apenas no fim das obras - quando a intervenção de um órgão como o TCU é
obviamente pouco eficaz. Até parlamentares da base aliada resistiram à
investida do Executivo, para evitar uma desmoralização muito evidente do
Legislativo. Mas a defesa da prerrogativa do Congresso foi apenas
parcial.
Os parlamentares poderão dar a palavra final sobre a suspensão de
obras, mas o Executivo e suas empresas poderão apresentar um relatório
sobre os custos da interrupção e assim defender a continuação da obra.
Essa concessão abre, naturalmente, um bom espaço para o governo impor
sua vontade também nesse caso, bastando mobilizar sua base no Congresso.
Se isso ocorrer, o Congresso terá apenas conseguido salvar a face,
encenando um diálogo com o Executivo.
A discussão sobre a LDO foi só uma etapa do longo conflito entre o
governo petista e o TCU. O presidente Lula queixou-se muitas vezes da
ação do tribunal, como se os seus técnicos e ministros agissem de forma
irresponsável - ou por motivação político-partidária - ao apontar
irregularidades em licitações ou na execução de projetos.
Mas o presidente jamais cobrou de seus colaboradores maior cuidado
com as normas da administração pública na elaboração e na execução de
projetos. Se o fez, não foi com ênfase e com clareza suficientes para
mostrar a seriedade de suas intenções. Em muitos casos, se não em todos,
a desatenção às normas é uma demonstração de irresponsabilidade ou de
incompetência gerencial.
Pode-se discutir a qualidade de certos dispositivos da Lei de
Licitações ou dos critérios do TCU. Se ocorrer essa discussão e se
houver propostas sérias para a mudança das normas, o caminho correto, no
Estado de Direito, é o encaminhamento de um projeto de reforma legal.
Mas o presidente Lula jamais apresentou propostas estruturadas para esse
tipo de mudança. É mais fácil acusar o TCU de atrapalhar o progresso do
País.
Fonte: Estadao.com
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