O Estado de S.Paulo
Causou estranheza, principalmente nos meios sindicais, a
redução das verbas federais para custear treinamento profissional, num
período em que um dos maiores desafios do Brasil está justamente na
falta de mão de obra qualificada. Segundo estudo do Ministério do
Planejamento, os gastos do governo federal, de 2003 a 2008, com
programas de qualificação financiados pelo Fundo de Amparo ao
Trabalhador (FAT) foram de R$ 97 milhões por ano, 87% a menos que a
média anual de R$ 768 milhões despendidos entre 1999 e 2003, no segundo
mandato do presidente Fernando Henrique. O ano passado foi o de menores
gastos (R$ 40,4 milhões), o que irritou o representante da CUT no
Conselho Deliberativo do FAT (Codefat), Quintino Marques Severo. Dos 6
milhões de trabalhadores que receberam seguro-desemprego em 2009, apenas
200 mil frequentaram cursos de qualificação, o que, afirmou, "é um dado
gritante".
Para este ano, o Ministério do Trabalho tem previsão de gastar R$ 226
milhões nessa área, valor bem abaixo da média do governo anterior.
Vê-se que o Planalto é muito mais sensível às reivindicações dos
funcionários públicos do que às exigências de formação de mão de obra
apta para atender às necessidades de desenvolvimento do País. Assim,
quando tem de cortar despesas, o governo prefere podar as verbas do FAT
para preparo e reciclagem de trabalhadores.
A questão, porém, é mais grave. O poder público está obrigado, pela
Constituição, a proporcionar educação fundamental a todos os brasileiros
e, se o País avançou com a universalização do ensino, este deixa ainda
muito a desejar quanto à qualidade. Especialistas insistem na
necessidade de maiores investimentos públicos no ensino fundamental e
médio ? sem esquecer do aperfeiçoamento do ensino superior.
Se o Brasil tivesse progredido mais na área da educação básica, isso
facilitaria enormemente a qualificação profissional em outras etapas.
Empresas que treinam mão de obra se queixam do baixo nível de
escolaridade e de conhecimento técnico de trabalhadores inscritos em
seus cursos, o que exige um esforço redobrado dos instrutores.
Quanto menos desenvolvida é a região, maiores são as dificuldades.
Exemplo expressivo é o que se verifica na Hidrelétrica de Santo Antônio,
em construção em Rondônia. Segundo o encarregado da obra, José
Pinheiro, declarou ao Estado (11/6), o maior problema ali foi a falta de
mão de obra local. A princípio, só 30% dos trabalhadores podiam ser
recrutados na região, o resto teve de vir de fora. Hoje, depois de
criados cursos de treinamento, essa proporção já se eleva a 90%.
Não é preciso ir tão longe para comprovar o esforço que empresas de
diversos setores vêm desenvolvendo para preparar mão de obra. Isso se dá
tanto em atividades que exigem qualificação relativamente baixa como em
nível mais elevado, tendo aumentado consideravelmente a demanda por
tecnólogos, graduados por cursos de dois anos depois de concluído o
ensino médio. Como resultado, multiplicam-se os cursos desse tipo
oferecidos por escolas técnicas ou mantidos por universidades ou
faculdades públicas e privadas ou por entidades empresariais, como o
Sistema S.
Isso não quer dizer que os programas financiados pelo FAT sejam
inúteis. Houve denúncias de desvio de recursos repassados pelo Fundo e
que têm sido objeto de investigação pelo TCU e pelo Ministério Público.
Mas não foi por essa razão que o governo cortou as verbas para esses
programas, e sim porque simplesmente eles não figuram entre as suas
prioridades.
Já seria um grande passo se o governo se concentrasse mais no ensino
fundamental. Quanto aos cursos técnicos de formação, treinamento e de
educação continuada, o Ministério da Educação deve cuidar da
fiscalização e do aprimoramento dos mecanismos de avaliação periódica.
Cabe, enfim, às empresas e às instituições regulares de ensino, que não
recebem subsídios, a importante tarefa de satisfazer a demanda atual do
mercado de trabalho e ao mesmo tempo preparar-se para atender às
necessidades do País no futuro.
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