José
Serra, que será confirmado neste sábado candidato do PSDB à Presidência
da República, é conhecido por sua capacidade de gestão administrativa
tanto quanto por sua maneira peculiar de atuação na política.
Sua característica pessoal que mais salta aos olhos do eleitor e que
o torna um político de comportamento original é a demora em anunciar
sua candidatura nas várias vezes em que concorreu a eleições. Para
muitos, trata-se de indecisão, para outros, como afirmam mais de um
tucano, é reflexo de sua tendência de buscar sempre o domínio das
situações.
Quer ter controle sobre todas as variáveis antes de se decidir, analisa as pesquisas e ambiciona ter certeza do apoio político.
"Antes de decidir, ele ouve bastante gente", disse o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em entrevista recente.
Foi assim nas campanhas para a prefeitura de São Paulo (2004), para
o governo paulista (2006) e de novo agora, para a Presidência. A
derrota de 2002 para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva só deve ter
intensificado este seu lado.
Nas duas outras vezes em que saiu derrotado da disputa concorreu a
prefeito de São Paulo (1988 e 1996), mas teria entrado mais a pedido do
partido.
Se relutou em algumas, nas duas nacionais brigou para ser o
candidato do PSDB à Presidência. Em 2002, enfrentou caciques do
partido, como o senador Tasso Jereissati (CE), e o aliado DEM, que
queria ter vida própria, com Roseana Sarney.
Nesta eleição, aos 68 anos, disputou cada palmo com o então
governador de Minas Gerais, Aécio Neves. Teve a seu lado aliados de
peso como Fernando Henrique, para quem esta era a vez de Serra e não de
Aécio.
Se perdeu duas vezes para prefeito e uma para presidente, Serra foi
eleito duas vezes como deputado federal (1986 e 1990) e uma como
senador (1994), neste caso com 6,5 milhões de votos. Para o governo do
Estado venceu no primeiro turno, depois da vitória na prefeitura.
"Serra é uma liderança com visão tática. Não é impetuoso", descreve
seu amigo de quase 50 anos, o ex-ministro da Justiça José Gregori.
Antes dos cargos eletivos, Serra foi ministro de Fernando Henrique (1995-2002), à frente das pastas do Planejamento e da Saúde.
Foi na Saúde que obteve resultados de que desfruta até hoje junto ao
eleitorado. Reduziu o preço dos medicamentos para o tratamento da Aids,
o que lhe rendeu elogios internacionais, implementou os medicamentos
genéricos e proibiu a propaganda de cigarro na televisão.
O combate ao fumo ainda seria complementado, já como governador, com
a proibição em todos os locais fechados do Estado de São Paulo.
Sua estreia em cargos públicos foi como secretário do Planejamento
do governador de São Paulo, Franco Montoro, em 1983 --o primeiro após o
exílio. Ele atuou como "primeiro-ministro" de Montoro, definição que
ganhou por sua contribuição à gestão do governador.
ENTENDENDO A ECONOMIA
Aos 22 anos, Serra partiu para exílio de 14 anos, vivendo na
Bolívia, Chile e depois Estados Unidos. Como presidente da União
Estadual dos Estudantes em 1962 e União Nacional dos Estudantes em
1963, era 'persona non grata' no Brasil depois do golpe militar de
1964.
Ele integrava a clandestina Ação Popular (AP), organização de origem
católica que teve entre seus fundadores o sociólogo Herbert de Souza, o
Betinho.
Serra estudava engenharia na USP, mas no exterior especializou-se em
economia. De volta ao Brasil em 1978, foi professor da Unicamp. Foi no
Chile e depois nos EUA que se aproximou de Fernando Henrique Cardoso,
inicialmente seu professor. Os dois, entre outros, formaram o núcleo do
PSDB, criado em 1988.
O candidato gosta de contar em público que optou pela economia para poder discutir o assunto com os economistas.
Tem pelo menos três obsessões nesta área: cortar gastos públicos,
com a promessa de não alterar os programas sociais; cortar a taxa de
juros para estimular a economia; e recolocar o real em patamar não tão
à frente do dólar incentivando exportações.
Nesta campanha deixou estarrecidos setores do mercado financeiro (e
do governo Lula) ao afirmar que o "Banco Central não é a Santa Sé",
deixando claro que a instituição não deve ter a autonomia apregoada por
seus defensores.
A declaração reflete seu estilo franco aliado ao acentuado espírito
crítico. Como conta José Gregori, a certeza do que quer faz com que
Serra deixe transparecer suas opiniões aos interlocutores, para o bem
ou para o mal.
"É enganador aquele que nunca quer desagradar", resume o ex-ministro.
Para um parlamentar do partido, o que faz de Serra um debatedor
quase imbatível é uma aliança de boa formação intelectual, ótima
memória e sólidos argumentos.
Quando comenta seu próprio temperamento, deixa à mostra a ironia.
"Se depois de 40 anos de vida pública o único reparo a mim é que eu
seria antipático, parece-me uma consagração, até porque eleição não é
concurso de calouros", contou Serra no livro-entrevista "O Sonhador que
Faz".
No mesmo texto, confirma que gosta de resolver problemas à noite,
quando lhe vêm as soluções. "O meu humor em geral melhora ao longo do
dia. O ponto melhor é quando a luz do dia começa a ir embora."
Nessas madrugadas, acabou apaixonado por se comunicar pelo microblog
Twitter, onde faz comentários sobre música, cinema e o Palmeiras. Foi
ali que revelou sua série norte-americana preferida: "Monk", em que o
personagem-título sofre de Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC), além
de uma série de tiques e fobias.
Serra nasceu em 19 de março de 1942, no bairro da Mooca, zona leste
de São Paulo, filho único de Francesco Serra, imigrante italiano que
tinha uma barraca de frutas no mercado municipal da Cantareira, e de
Serafina Chirico.
O ex-governador fala sempre com orgulho da família. No evento para o
lançamento de sua pré-candidatura, em abril, falou com emoção que o pai
carregou caixas de frutas para que ele pudesse carregar caixas de
livros.
Serra é casado com a chilena Mônica Allende (parente distante do
presidente Salvador Allende deposto em 1973), tem dois filhos, Verônica
e Luciano, e três netos.
Fonte: CARMEN MUNARI - REUTERS
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