Vice de São Paulo espera herdar “Ferrari” de Serra

Goldman deve assumir o comando do Estado em abril, quando o governador deixar o cargo

Divulgalção
Alberto Goldman (à esq.), atual vice-governador de São Paulo, deve
assumir o lugar de José Serra no comando do Estado a partir de abril
Ele diz que ainda não está certo, mas o vice-governador de São Paulo, Alberto Goldman (PSDB), já se prepara para assumir o comando da administração paulista assim que o governador José Serra (PSDB) resolver deixar o cargo para disputar a Presidência. A renúncia de Serra precisa acontecer até o dia 2 de abril para que ele possa ser candidato em outubro.
Goldman se diz tranquilo com a tarefa que deve ter pela frente e refuta comparações com Cláudio Lembo (DEM), vice de Geraldo Alckmin (PSDB) no governo de São Paulo que, após assumir o fim do mandato do tucano em 2006, reclamou: “diziam que estavam me entregando uma ‘Ferrari’, mas estavam me entregando um ‘fusquinha velho’”. Ele se referia a condições das contas do governo.
A história se repete em 2010, com Goldman servindo de “governador tampão” para Serra. Mas, desta vez, ele garante:
- Vou pegar uma “Ferrari” e vou continuar com uma “Ferrari”.
Para Goldman, a única diferença garantida entre o seu governo e o de Serra será o horário de trabalho. O atual governador costuma acordar tarde e ficar até a madrugada trabalhando, enquanto Goldman diz acordar cedo, por volta das 5h.
Uma outra diferença fundamental entre o governador e o seu substituto está no futebol. Goldman é torcedor do Corinthians, arquirrival do Palmeiras de Serra.

O vice-governador recebeu o R7 no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista, e, entre uma reunião e outra com Serra, conversou com a reportagem:
R7 - Ainda não é certo que o senhor será o governador?
Alberto Goldman – Não. A certeza só terei no dia que o governador entregar o ato de renúncia do mandato dele até o final do ano. Isso pode ocorrer até o dia 2 [de abril]. E, se houver, provavelmente será no dia 2 mesmo.
R7 - O senhor começou na política no PCB e hoje é do PSDB, que tem uma identificação com o eleitor mais conservador, houve alguma mudança na sua ideologia política ao longo do tempo?
Goldman – Eu acho que o central do PSDB, o seu cerne, o seu núcleo, que são os dirigentes do partido, são de centro-esquerda. Daí depende do que você considera de centro-esquerda. Eu considero o PSDB um partido de centro-esquerda, tem correntes mais à esquerda, mas tem, é verdade, um eleitorado mais conservador na medida em que os partidos chamados mais conservadores desapareceram, perderam a característica.
R7 - Mas o senhor ainda se autodefiniria como um comunista?
Goldman – Não me defino ideologicamente. Me defino como uma pessoa que tem uma cabeça com ideias muito próximas ao que eu tinha com relação às transformações que são necessárias. Evidentemente, não sob a ótica que se construiu do próprio socialismo na União Soviética. Se construiu numa ótica de uma revolução, de uma ditadura do proletariado e de uma ideia de que o Estado era um todo poderoso que poderia fazer as transformações necessárias, isso não está na minha cabeça. Primeiro eu considero a democracia como um valor absoluto e superior a qualquer outro. Portanto, não passa pela minha cabeça algo que se aproxime de ditadura ou qualquer coisa que seja. Não vejo o Estado como o dono, proprietário de todas as coisas, das casas, dos campos, das virtudes. Acho que o Estado tem que ter um papel de controle, fiscalizador, regulador, de incentivador do desenvolvimento, mas não acho que ele deve ser o operador. O Estado não deve fazer negócios em ramo nenhum, a não ser num ramo em que o setor privado não entre.
R7 – Um Estado mínimo?
Goldman – Não, um Estado atuante, forte, mas não operador. Ele não deve produzir eletricidade, não deve produzir telefonia, metalurgia, siderurgia, não deve ser o dono das empresas, mas um articulador daquilo que é responsabilidade do Estado e um incentivador do setor privado.
O PSDB é um partido de centro-esquerda, individualmente com pessoas mais de esquerda ou menos de esquerda, menos conservadora ou mais conservadora, tem de tudo. Para mim, um partido que imagina que o Estado brasileiro possa ser o feitor de tudo, o produtor de tudo, não é uma visão de esquerda. É uma visão bem reacionária e bem conservadora. Se você me perguntasse como eu classifico o PT eu diria que é um partido conservador. Ou seja, se dependesse deles teríamos a siderurgia na mão do Estado, a mineração na mão do Estado, a energia elétrica, a telefonia, você teria tudo aquilo que tinha na época do Getúlio Vargas, estaria tudo igual. Naquela época foi importante, mas a partir da década de 80 não tinha mais sentido, era uma posição conservadora, e eu acho que o PT tinha essa posição conservadora. Mudou agora no governo Lula, quando o PT se tornou mais liberal, mais centrista na prática política.
R7 – Alguma figura política o inspira na sua vida pública?
Goldman – Tenho boas relações e respeito por algumas figuras, como o Fernando Henrique [Cardoso, ex-presidente], acho que ele teve um papel importante na história, pois rompeu uma série de tabus que existiam. Respeito a figura do Serra, porque ele pode continuar a romper tabus e garantir a minha concepção de que o Estado é um Estado forte, presente, ativo, indutor, mas não operador do dia-a-dia das atividades econômicas.
R7 – Qual é o principal problema no Estado de São Paulo atualmente?
Goldman – Acho que nós temos algumas áreas em que se avançou, mas temos que avançar muito mais. É o caso da educação. A partir do momento que se conseguiu colocar praticamente todas as crianças na escola, o problema passou a ser de qualidade do ensino. Historicamente, a qualidade de ensino no Brasil, e em São Paulo também, é uma qualidade ainda muito aquém do necessário. Aqui em São Paulo um dos investimentos mais importantes é exatamente na melhoria do ensino fundamental, do ensino médio e na qualificação através dos cursos técnicos e tecnológicos. Para se ter uma ideia, em 2007, nosso orçamento na área de cursos técnicos era de R$ 300 milhões, hoje já ultrapassa o R$ 1 bilhão. Mais do que triplicamos.
R7 – Assumir o governo de São Paulo será o seu maior desafio na vida pública?
Goldman – Acho que não. O maior desafio da minha vida na política foi enfrentar a ditadura. Esse foi um desafio, para valer. Agora não, enfrentar a administração de São Paulo por esse período restante, diante do meu histórico, não é algo tão ousado. Não me causa nenhuma intraquilidade.
R7 – Citando a metáfora do ex-governador Cláudio Lembo após assumir em 2006, o senhor acredita que vai pegar uma “Ferrari” ou um “Fusca velho”?
Goldman – Vou pegar uma “Ferrari” e vou continuar com uma “Ferrari”. Eu conheço, pois, diferentemente do Cláudio Lembo, que não participou, não teve chance de participar intensamente do governo, eu estou participando. Talvez perdemos uma “Ferrari” e ganhamos uma “Maserati”. Vou pilotar uma “Maserati”. Eu não tenho nenhuma preocupação quanto a isso, porque não vou pegar uma coisa que eu desconheço. Eu ajudei a construir. Portanto, os defeitos que têm eu participo deles, as virtudes que têm, eu participo delas também.
R7 – O que faz quando não está trabalhando?
Goldman – No meu tempo livre eu gosto basicamente de ler, ver filmes, tocar piano. Estou recomeçando agora, sou formado em piano. Gosto de fazer um pouco de exercícios, gosto de jogar basquete, jogo na ACM, no centro.
R7 – Uma grande diferença do senhor com o Serra é no futebol, o senhor é corintiano?
Goldman – Ah, sim.
R7 – Mas corintiano de ir ao estádio?
Goldman – Eu ia muito, mas ultimamente eu não....agora até que estou retomando um pouquinho mais, está um pouco mais gostoso. Mas teve um tempo muito ruim, muito comercializado, virou um negócio muito profissionalizado. Quando eu vejo que um sujeito desses ganha milhões por mês e pessoas importantes desse país às vezes ganham tão mal...
R7 – Já viu o Ronaldo jogar? Pretende ir?
Goldman – Se tiver chance, sim. Mas não chega a ser uma vontade incontrolável. [risos] Vejo pela televisão, vejo muito futebol pela televisão. Mas não sou tão fanático quanto o Serra. Já fui muito fanático, ganhei prêmio da Gaviões da Fiel até.
R7 – O senhor não pretende se candidatar esse ano?
Goldman – Não é a minha intenção.
R7 – Como o senhor vê o seu futuro político?
Goldman – Depois da eleição é que a gente vai saber. Pretendo continuar trabalhando, não pretendo deixar a vida política totalmente. Desde os 33 anos de idade até hoje estou vivendo na vida política. Neste ano completo 40 anos de vida política profissional. Gostaria de continuar, mas não quero ter grandes cargos com enormes responsabilidades. Posso ter grandes responsabilidades sim, mas que não sejam responsabilidades que possam me impedir de continuar tendo uma vida em que eu possa me dedicar às outras coisas que eu gosto, como ler, escrever, cinema. Uma vida um pouco mais individual. Cuidar das minhas três netas, dos cinco filhos que eu mal cuidei nestes 40 anos.
R7 – O senhor tem participado da discussão da candidatura do Serra?
Goldman – Tenho participado de tudo.
R7 – Qual é a sua opinião sobre a escolha do vice? Defende a chapa puro-sangue?
Goldman – Acho que, decidido agora, vamos ver qual é o melhor nome [para vice]. Mas acho que o candidato a vice, do ponto de vista de votos, ele agrega muito pouco. O importante é encontrar alguém que possa identificar bem uma composição partidária e uma composição social também. Alguém que possa ser respeitado, não um vice que você teme, que se acontecer qualquer coisa o vice é um desastre.
R7 – O senhor acompanha o ritmo de trabalho do Serra, que costuma ficar até de madrugada trabalhando?
Goldman – O meu ritmo é igual, só o horário que é diferente. Acordo cedo, 5h30, e vou dormir 23h, 23h30, meia-noite no máximo. A única coisa que eu garanto que vai ter mudança com relação a eu e o Serra é esse horário de trabalho e, provavelmente, o cumprimento de agenda. Eu sou meio doentio com relação a esse negócio, eu acho que vem do meu pai. Meu pai é assim, ele nunca atrasou em nenhum lugar sequer um minuto. Então eu fico com um pouco disso, ansioso quando não consigo cumprir. Mas eu sei que governador exige uma atenção maior, telefonemas, isso, aquilo. Isso vai ter. Sei que não vou conseguir fazer, durante o exercício de governador, o mesmo que eu fiz como vice-governador, mas vou procurar me aproximar da perfeição.

Fonte: Thiago Faria - R7

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