Anvisa libera aplicação da ButanVac em voluntários

Agência já havia autorizado início de testes em humanos, mas processo estava parado à espera de dados sobre inativação do vírus



Paula Ferreira e Giuliana de Toledo - O Globo

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou nesta quarta-feira o início da aplicação da vacina ButanVac em voluntários. Os testes ainda não tinham começado porque o Istituto Butantan, responsável pelo desenvolvimento do imunizante, ainda não havia apresentado dados sobre a inativação do vírus. Em uma reunião na tarde desta quarta, o Instituto forneceu as informações e o processo foi autorizado pela Anvisa.

As fases 1 e 2 dos testes terão participação, no total, de seis mil voluntários acima de 18 anos e estão divididas em três etapas: A, B e C. A autorização da Anvisa é referente à primeira delas, a A, que terá cerca de 400 participantes. É nesse momento que o Butantan definirá a quantidade de mililitros de cada dose a partir da divisão dos voluntários em três grupos. A proposta dos desenvolvedores prevê aplicação da ButanVac em duas doses, com intervalo de 28 dias entre elas.

VACINAÇÃO

No domingo, o colunista Lauro Jardim noticiou que o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), estima que a aplicação da ButanVac na população começará em outubro. A Anvisa, no entanto, evita estabelecer data para a aprovação do imunizante.

De acordo com o gerente geral de Medicamentos da Anvisa, Gustavo Mendes, embora a expectativa seja de que o desenvolvimento da ButanVac seja mais célere que das outras vacinas existentes, não é possível estipular um prazo para que as fases sejam concluídas.

— Há vários fatores que interferem no prazo da fase de teste, como a dificuldade de recrutar voluntários, que não parece ser o caso da ButanVac, mas também dificuldade em obter resultados. É um desenvolvimento que ainda está numa fase inicial, muitas informações precisarão ser elaboradas sobre segurança e eficácia da vacina para que a gente possa vislumbrar sua aprovação — explica Mendes.

Diferentemente de outras vacinas, como a de Oxford e a CoronaVac, a ButanVac é desenvolvida no Brasil do zero. De modo que o acompanhamento pela Anvisa se dá desde as fases iniciais. No caso dos outros imunizantes, foram fornecidos à agência os dados já do resultado desses testes.

Recrutamento

Segundo o Butantan, a primeira etapa da fase 1 da pesquisa envolverá 418 voluntários recrutados pelo Hospital das Clínicas da USP de Ribeirão Preto. O início da aplicação das doses da Butanvac ocorrerá nos próximos dias, informou o governo paulista, sem especificar a data. "Neste primeiro momento será avaliada a segurança do imunizante e a dosagem mais adequada", explicam em nota.

A inscrição dos interessados foi feita desde a semana passada no hospital da cidade do interior paulista. "A seleção será feita a partir da localidade dos participantes. O critério para participação nessa etapa dos ensaios clínicos é ter mais de 18 anos de idade e não ter sido vacinado contra o novo coronavírus", diz, em nota, o governo estadual.

Após esse primeiro período em Ribeirão Preto, mais voluntários devem ser chamados em outros centros de pesquisa. Essas informações serão anunciadas futuramente aos que se pré-cadastraram para ajudar na pesquisa.

Todas as doses que serão usadas na pesquisa já estão prontas, além de muitas mais de reserva. Segundo o Butantan, já são cerca de 10 milhões de doses estocadas da ButanVac. Até outubro, a expectativa é ter 40 milhões de doses prontas para o uso, aguardando os resultados dos testes.

A Butanvac se baseia em uma tecnologia que utiliza o vírus da Doença de Newcastle (que ataca apenas aves)geneticamente modificado. Esse desenvolvimento foi feito por cientistas da Icahn School of Medicine at Mount Sinai, em Nova York. O vírus da doença aviária funciona como um vetor viral da proteína Spike do coronavírus de forma íntegra. É assim que a vacina deve conseguir uma resposta imune.

Por ser produzida usando ovos de galinha, uma tecnologia conhecida para a fabricação das vacinas contra gripe, a ButanVac consegue ser feita de ponta a ponta no Brasil, sem a dependência de importação de matéria-prima, e de forma mais barata, segundo o Butantan.

Reunião com a Opas

Com a aprovação e o desenvolvimento de novas vacinas, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) realizou uma reunião nesta quarta com agências regulatórias de vários países, incluindo a Anvisa. Durante a conversa, a OPAS iniciou uma discussão sobre a utilização de placebo em desenvolvimento de vacinas contra Covid-19, uma vez que cada vez mais pessoas terão anticorpos devido à disseminação natural da doença.

A tendência é que os estudos sejam comparativos entre os imunizantes já existentes, diante disso, a organização chamou atenção para a necessidade de que as agências analisem meios para garantir o acesso dos institutos de pesquisa aos imunizantes existentes em um cenário de escassez de vacina.

Outro ponto levantado pela organização foi a possibilidade de ampliação do critério de eficácia das vacinas, que é definido pelas agências regulatórias. No Brasil, por exemplo, um imunizante contra Covid-19 precisa alcançar pelo menos 50% de eficácia. As discussões sobre o tem, no entanto, ainda são muito iniciais.

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