Embaixadores nos EUA indicam livros que representem seus países. Brasil não foi convidado a opinar

Pergunta na rampa

 presidente Jair Bolsonaro

Washington Olivetto - O GLOBO

A revista “Condé Nast Traveller” refez recentemente uma matéria que já havia feito com sucesso em 2017. Convidou embaixadores de diversos países nos EUA a indicar um livro fundamental para um turista ler antes de visitar seu país.

Aqui estão alguns dos livros indicados por alguns dos embaixadores.

Alemanha: “Tchick”, sobre a amizade de dois meninos de 14 anos. Um de família burguesa e outro, repatriado.

Azerbaijão: “Azerbaijan Diary” narra as aventuras de um repórter desonesto numa república pós-soviética rica em petróleo, mas dilacerada pela guerra.

Bélgica: “Guerra e terebentina”, sobre a Primeira Guerra Mundial e os excepcionais pintores belgas.

Canadá: “Ru”, de um autor vietnamita que virou canadense, sobre como foi deixar sua terra natal e se adaptar ao Canadá, país que celebra a diversidade como poucos.

Colômbia: “Cem anos de solidão”, clássico de Gabriel García Márquez.

Costa Rica: uma coletânea de contos de diversos autores chamada “Costa Rica: A Traveller’s Literary Companion”.

Dinamarca: “Senhorita Smilla e o sentido da neve”, que fala das culturas da Dinamarca e da Groenlândia.

República Dominicana: “There is a Country in the World”, quase um hino para aquele povo que viveu miséria e opressão.

Finlândia: os livros da coleção “The Moomins”, originalmente escritos como contos de fadas para crianças, símbolos da infância de cada finlandês.

Geórgia: “The Eighth Life”, sobre a ascensão e queda do regime comunista totalitário.

Jamaica: “Selected Poems”, que explica o que significa ser jamaicano.

Irlanda: “Transatlântico”, sobre o processo de paz na Irlanda em 1998.

Índia: “Esta noite a liberdade”, sobre a Independência indiana, até a morte de Mahatma Gandhi.

Líbano: “Where Will My Heart Beat?”, sobre a universalização do Líbano.

Nova Zelândia: “Encantadora de baleias”, sobre uma mulher que sabia se comunicar com as baleias.

Rússia: “Moscow and Muscovites”, uma espécie de enciclopédia da vida de Moscou na virada do século 20.

Suécia: “Um homem chamado Ove”, que mostra que nunca é tarde para descobrir novos pensamentos, ideias e pessoas.

Reino Unido: “Reparação”, sobre a Inglaterra desde a Segunda Guerra Mundial até a virada do milênio.

Curiosamente, o embaixador do Brasil, sempre famoso pela qualidade da sua diplomacia e riqueza da sua literatura, não foi convidado e acabou não aparecendo na publicação.

O fato é surpreendente, até porque, neste mesmo 2021, o cineasta nova-iorquino Woody Allen, entrevistado por Pedro Bial, citou Machado de Assis como um dos seus escritores favoritos. E, historicamente, o Brasil sempre aparece nas listas que elegem música, futebol, arquitetura, artes plásticas, medicina, odontologia, direito, jornalismo, publicidade e literatura de alta qualidade.

Conversei com alguns amigos brasileiros a respeito desse fato, e chegamos a uma primeira conclusão.

Certamente, não se trata de uma perseguição dos comunistas, até porque a editora Condé Nast —que publica revistas como “Traveller”, “Vogue”, “New Yorker”, “Vanity Fair” e “GQ” —, de comunista, não tem nada. É quase um depósito de grã-finos.

Mas existem outras duas hipóteses. Quando a matéria foi feita, o ministro das Relações Exteriores era Ernesto Araújo, que dizem não ser uma figura muito querida na diplomacia mundial, o que explicaria a não inclusão do embaixador brasileiro. Fora isso, temos ainda o fato de o presidente Jair Bolsonaro jamais ter escondido sua preferência pelo porte de armas ao porte de livros, dando inclusive oportunidade para que funcionários da Receita Federal, usando o argumento de que no Brasil só os ricos leem, considerassem a criação de uma taxação de impostos às editoras.

São apenas suposições, mas que conduzem a outros raciocínios.

A taxação de impostos sobre livros, sem dúvida nenhuma, seria uma tragédia num país que precisa ler mais do que nunca. Mas, se ela realmente acontecesse, com certeza, no outro dia já surgiriam comentários dizendo que finalmente estava explicado por que, desde o início do governo, o ministro Paulo Guedes foi apelidado de Posto Ipiranga, em vez de Enciclopédia da Economia.

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