Em meio a pandemia e endividamento histórico, prefeitos iniciam mandatos com medidas de ajuste fiscal

Rio e São Paulo adotaram corte de comissionados e revisão de contratos

Bruno Covas, prefeito reeleito de São Paulo, disse que medidas de austeridade são necessárias para enfrentar crise econômica e social 
Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

Henrique Gomes Batista - O Globo

A posse dos novos prefeitos foi marcada pelo anúncio de medidas de austeridade fiscal, não apenas para fazer frente aos gastos com a piora da pandemia, mas também para adequar as contas que, na maior parte das cidades brasileiras, já apresentavam problemas. O elevado endividamento e comprometimento das receitas com pagamento de pessoal e aposentados é um obstáculo histórico no país.

Especialistas avaliam que a adoção das providências logo após a posse tem duplo objetivo: sinalizar rapidamente um caminho fiscal responsável e concentrar medidas impopulares em um momento em que ainda gozam de grande popularidade. O economista José Roberto Afonso, professor do IDP, afirma que estas ações são necessárias para rearrumar as contas, ainda que, de maneira geral, as prefeituras tenham melhor desempenho na área do que os governos estaduais.

— Em geral, desde a Lei de Responsabilidade Fiscal, os números, mais que o discurso, mostram as prefeituras como entes públicos que melhor administram as contas — disse Afonso.

No Rio, o prefeito Eduardo Paes (DEM) publicou 44 decretos relacionados à área econômica. As normas incluem a elaboração de um possível plano de recuperação fiscal e de uma proposta de reforma tributária, além de medidas de enxugamento de despesas da prefeitura, como corte de cargos comissionados e exigência de sindicância antes de pagamentos de despesas da gestão anterior.

A economista Margarida Gutierrez, professora do Coppead/UFRJ, defende que a gestão tenha foco na reforma da Previdência municipal, tema que já sendo analisado pelo governo recém-empossado.

— O governo tem que focar na previdência, pois o problema das prefeituras é a folha de pagamento. Para a Prefeitura do Rio, a receita é a básica, que vale também para outras cidades e estados: é transferir mais serviços para a iniciativa privada e enfrentar o desequilíbrio da folha de pagamento, incluindo ativos e inativos. Gastos com educação e saúde são todos carimbados e, para ter recursos para estas áreas, é preciso cortar os gastos com pessoal — afirmou Margarida.
Crise 'sem precedentes'

O prefeito reeleito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), também anunciou medidas para conter despesas. Um decreto prevê a redução de, no mínimo, 10% dos cargos e empregos de provimento em comissão, bem como funções de confiança. Os órgãos têm até 31 de janeiro para apresentar a lista dos cargos que serão cortados.

Além disso, o texto determina que todos os órgãos da prefeitura devem revisar e renegociar contratos, convênios e parcerias, incluindo a possibilidade de redução de índices de correção. Além disso, terão de reavaliar as licitações em curso ou planejadas. Estas duas medidas precisam ser concluídas em 90 dias.

— Enfrentaremos uma crise econômica sem precedentes, que se segue a uma década perdida muito mais severa do que aquela dos anos 1980. Uma crise social na qual a pandemia ampliou o já vexatório fosso que separa ricos e pobres em nosso país e que ora se agrava com a mais alta taxa de desemprego da nossa história — afirmou Covas, no discurso de posse.

Juliana Inhasz, professora do Insper, afirma que a população já está esperando este tipo de medidas em início de mandato. Para ela, mais que as ações em si, decretos de austeridade no início de governos dão peso político para a necessidade de responsabilidade fiscal.

— Em São Paulo, houve sinal cruzado: as medidas de austeridade foram anunciadas poucos dias após o prefeito ter sancionado o aumento de seu próprio salário, a partir de 2022, em 46%. Da mesma forma, foi anunciado que a tarifa do transporte público não terá aumento, em troca do fim da gratuidade para idosos entre 60 e 65 anos. Medidas assim confundem a população — acrescenta Juliana.

Comentários