Primeira governadora de Pernambuco espera ter pontes com Lula e mira combate à pobreza

Ex-prefeita Raquel Lyra, do PSDB, põe fim a ciclo de 16 anos de poder do PSB no estado

Raquel Lyra

José Matheus Santos - Folha.com

Primeira governadora da história de Pernambuco, Raquel Lyra (PSDB) toma posse neste domingo (1º) tendo como desafios a superação da crise na saúde pública do estado, o desemprego e a desigualdade. Além disso, busca imprimir a marca tucana após o fim da era de 16 anos seguidos do PSB no poder.

Com Raquel no Palácio do Campo das Princesas, pela primeira vez uma mulher estará no cargo de governadora de Pernambuco —uma outra mulher será a vice-governadora, Priscila Krause (Cidadania).

Raquel faz parte da nova geração de quadros do PSDB. O partido quer se recuperar após a derrota em São Paulo e a redução das bancadas no Congresso Nacional.

Além de Raquel, Eduardo Leite (RS) e Eduardo Riedel (MS) foram os outros governadores tucanos eleitos em 2022.

Raquel tem boa relação com Leite, que será o novo presidente do PSDB a partir de 2023. A expectativa de aliados é que ela passe a ter um cargo de destaque na direção nacional do partido.

A cientista política Priscila Lapa, doutora pela Universidade Federal de Pernambuco, avalia que Raquel pode ser alçada a um patamar de liderança nacional à frente do Executivo pernambucano.

"Já está dando [essa projeção]. Pelo contexto de mudança, pela história de Pernambuco e pelo protagonismo que ela representa hoje. Um novo perfil político. Em 2022, foram reveladas algumas lideranças, mas agora é a hora de ver quem afirmará esse protagonismo. E Raquel tem essa oportunidade e deverá evitar os desgastes que o poder inevitavelmente traz", afirma.

O novo governo quer formar uma base aliada consistente na Assembleia Legislativa. A tendência é que o número de deputados estaduais apoiadores do novo governo chegue a 30 dentre os 49.

"Estou confiante na formação de uma base aliada [forte] porque acredito no compromisso dos deputados com os anseios de mudança da população", diz a vice-governadora eleita, Priscila Krause.

O PL, partido de Jair Bolsonaro, tem uma ala favorável à independência e outra defensora da adesão ao governo de Raquel. O partido não declarou apoio oficial a Raquel no segundo turno da disputa contra Marília Arraes em outubro, mas diversos bolsonaristas da legenda apoiaram a então candidata do PSDB.

Na oposição, por certo, ficarão a federação de PT, PV e PC do B e o PSOL. O Solidariedade, partido de Marília Arraes, derrotada por Raquel no segundo turno, não deve marchar unido.

Outro partido que vai para a oposição é o PSB, que deixa o Palácio do Campo das Princesas após 16 anos, com dois mandatos de Eduardo Campos (morto em 2014) e dois de Paulo Câmara, de saída do governo.

Apesar da ida partidária para o campo oposicionista, há um racha na bancada de 14 eleitos pelo PSB para o parlamento estadual. Isso porque alguns deles foram para a sigla visando a facilidade de se eleger numa coligação robusta, sem priorizar a identificação com as bandeiras partidárias.

O futuro do PSB no estado passa agora pelas mãos do prefeito do Recife, João Campos. A reeleição dele em 2024 é tida como crucial para o partido ter força em uma eventual nova disputa pelo governo estadual daqui a quatro anos.

Raquel pretende ter um diálogo fluente com o governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Na campanha eleitoral, a ex-prefeita de Caruaru criticou embates entre os governos do PSB e as gestões federais sob Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro. Para Raquel, as disputas prejudicavam a atração de investimentos e obras federais para o estado.

Desde que foi eleita, Raquel já teve conversas com o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB). Os dois foram colegas de partido no PSDB durante cinco anos.

Em 2018, Raquel, inclusive, apoiou Alckmin na disputa presidencial. Em 2022, apoiou Simone Tebet (MDB) no primeiro turno e declarou neutralidade no segundo turno.

Outro que servirá como ponte da governadora eleita com a gestão Lula 3 será o novo ministro da Defesa, José Múcio Monteiro. Ex-deputado e pernambucano, ele é primo do ex-senador e ex-ministro Armando Monteiro Neto (PSDB), aliado de primeira hora de Raquel.

As prioridades de Raquel no início do governo, segundo integrantes que fizeram parte da equipe de transição, serão melhorias nas condições dos hospitais públicos do estado, combate à pobreza e busca por geração de emprego.

No primeiro semestre do governo, Raquel pretende lançar o programa Mães de Pernambuco, que deve conceder um auxílio de R$ 300 a mães com filhos de até seis anos que estão no CadÚnico. O objetivo é que o valor seja um complemento ao Bolsa Família do governo federal.

O Grande Recife é a região metropolitana do Brasil com o maior percentual de pessoas em extrema pobreza (cerca de 13%), segundo levantamento divulgado em agosto e feito por Observatório das Metrópoles, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina.

Na área da saúde, o governo eleito quer averiguar a situação e fazer intervenções nos hospitais da rede pública estadual. A situação mais preocupante está nas unidades do Recife, como o Hospital da Restauração, a maior emergência do Norte e Nordeste do país.

Na área econômica, o governo de Raquel terá de lidar com a segunda maior taxa de desemprego entre os estados brasileiros. Em novembro, Pernambuco tinha 13,9% de índice de desocupação, segundo o IBGE, o que representa 600 mil pessoas.


POSSE OCORRE 3 MESES APÓS MORTE DE MARIDO

Raquel assume o Governo de Pernambuco praticamente três meses após a perda do marido, o empresário Fernando Lucena. Ele morreu no dia do primeiro turno das eleições, em 2 de outubro.

Procuradora do estado e ex-delegada da Polícia Federal, a futura governadora é de uma família tradicional na política do agreste pernambucano.

A família tem origem política no campo da esquerda. O pai, o ex-governador João Lyra Neto (PSDB), já foi filiado ao MDB no período da ditadura (1964-1985) e passou por PSB, PT e PDT. O tio, Fernando Lyra (1938-2013), ex-deputado federal, foi candidato a vice-presidente na chapa de Leonel Brizola, em 1989.

Raquel já apoiou candidaturas de Lula à Presidência em 2002 e 2006. Em 2010, foi aliada de Dilma Rousseff (PT). No mesmo ano, foi eleita deputada estadual e reeleita quatro anos depois. Em 2014, ela seguiu o seu então partido, o PSB, ao apoiar Aécio Neves (PSDB) no segundo turno contra a petista.

Em 2016, deixou o PSB após o partido negar as pretensões dela para tentar a Prefeitura de Caruaru. Com a negativa, filiou-se ao PSDB e venceu a disputa. Em 2020, foi reeleita prefeita. Em março de 2022, renunciou ao cargo para disputar o Governo de Pernambuco.

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