A cena política vista da economia

Investidores com acesso à cúpula das campanhas de Lula e Bolsonaro relatam o clima das duas principais candidaturas


Alvaro Gribel - O Globo

A menos de três meses do primeiro turno das eleições, o alto escalão da campanha de Bolsonaro vive um momento de desânimo e enfrenta dificuldades para conseguir doações. Lula, por sua vez, mantém as incertezas sobre o seu programa econômico, mas os encontros ao lado de Geraldo Alckmin têm diminuído resistências da elite ao seu nome. Já há quem sonhe com o próprio Alckmin no Ministério da Economia, acumulando a função de vice. Esse é o resumo de conversas que tenho tido com investidores com acesso à cúpula das duas principais candidaturas.

Alckmin virou a nova aposta da Faria Lima para comandar a economia, embora seja difícil que o PT o aceite, pela sua formação liberal. Pessoas próximas ao presidente Lula dizem que nada está decidido. Nos encontros com empresários, Lula diz que nunca descumpriu contratos e manteve o superávit primário enquanto foi presidente. Alckmin assume a defesa mais enfática do equilíbrio fiscal e chega a dizer que os governos FHC e Lula foram de continuidade. Isso tem sido suficiente para melhorar a relação com investidores e alguns falam na volta do “Lulinha paz e amor”, por causa do clima de cordialidade dessas últimas conversas. As críticas em público aos banqueiros feitas pelo ex-presidente não têm causado desconforto, porque são vistas como parte do jogo eleitoral.

Bolsonaro continua tendo a preferência da elite, mas a PEC 01/22 esfriou a relação. As medidas foram vistas como eleitoreiras, principalmente a decretação do estado de emergência, que poderá abrir um precedente perigoso para as próximas campanhas presidenciais. A estagnação nas pesquisas em torno de 30%, os constantes escândalos envolvendo o governo — como a prisão do ex-ministro da Educação e a demissão do presidente da Caixa por assédio sexual — estão se refletindo nas doações. Se no encontro com o grupo Prerrogativas Lula teria arrecadado R$ 4,3 milhões, Bolsonaro teria recebido R$ 400 mil em jantar com o agronegócio.

O risco de faltar recursos para Bolsonaro é concreto, segundo uma fonte. O PL, seu partido, tem cerca de R$ 276 milhões de fundo eleitoral, mas a prioridade é manter as 78 cadeiras que garantam à legenda a maior bancada da Câmara. Só isso pode consumir R$ 156 milhões do fundo, sem contar os gastos para o Senado e a aposta em aumentar o número de governadores. A escolha de Braga Netto como vice não foi bem recebida, e a falta de habilidade de Michelle Bolsonaro, para se aproximar do eleitorado feminino, não tem agradado.

De várias fontes, ouvi que a vitória de Lula é o cenário “precificado”, ou seja, que não causaria surpresas. A preocupação é se o candidato irá adotar o caminho pragmático na economia, que poderia derrubar o dólar e atrair investimentos, ou se irá seguir a ala tradicional do PT, que aproximaria o Brasil da tragédia argentina.

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