Entrevista de Rodrigo Garcia à "Páginas Amarelas" da revista Veja

Tucano assume o governo a seis meses da eleição com críticas ao petismo e ao bolsonarismo para manter a hegemonia do PSDB em São Paulo

O governador de São Paulo, Rodrigo Garcia

Bruno Ribeiro - Veja

Décimo primeiro governador a comandar São Paulo desde a redemocratização, Rodrigo Garcia assumiu o cargo após a saída de João Doria (PSDB), que se lançou na corrida à Presidência. Garcia terá um duplo desafio: manter o desempenho positivo da elogiada gestão e, ao mesmo tempo, construir uma candidatura competitiva à reeleição estadual. Nome ainda desconhecido de boa parte do eleitorado, ele larga atrás dos principais adversários nas pesquisas, mas se apresenta como a alternativa à polarização entre o PT e o bolsonarismo, que em São Paulo serão representados por Fernando Haddad e Tarcísio de Freitas, respectivamente. Para isso, terá de lidar com os altos índices de rejeição deixados pelo antecessor, que se mantiveram mesmo com trunfos como o fundamental papel na vacinação contra a Covid-19 e o crescimento econômico superior ao do país. Formado em direito, Garcia tem 47 anos e nasceu em Tanabi, no interior paulista. Foi deputado estadual entre 1999 e 2011, federal nos oito anos seguintes e secretário de estado nos governos Geraldo Alckmin, José Serra e João Doria. Agora, tem a missão de manter o domínio do PSDB no estado, que vem desde a vitória de Mario Covas, em 1994. O recém-empossado governador recebeu VEJA no Palácio dos Bandeirantes, onde falou sobre a disputa estadual, as bicadas no ninho tucano em relação à candidatura à Presidência e as suas prioridades de gestão e de campanha.


ENTREVISTA

O senhor tomou posse após uma semana conturbada. Havia a possibilidade de não assumir o cargo, com a ameaça de João Doria de continuar no governo. Que lições tirou do episódio? 
Teve muita especulação sobre isso e pouca realidade. O fato é que a história terminou como deveria terminar. Doria sai para disputar a Presidência, eu assumo o governo de São Paulo. Estava previsto para ser assim.

Mas o que foi especulação e o que de fato aconteceu?  
Toda transição tem altos e baixos, há reflexões que são realizadas no momento em que ela acontece. Então, entendo como natural isso tudo. O fato é que, no último dia 1º, tomei posse como governador.

E como fica o PSDB diante dos acontecimentos da semana passada?  
O partido tem um candidato a presidente estabelecido por prévias, que é João Doria, e tem candidato a governador de São Paulo. A prioridade do PSDB é a eleição de São Paulo, a eleição de outros governadores e se posicionar na disputa nacional com seu candidato.

Na pandemia, São Paulo teve um papel fundamental na busca da vacinação e tomou medidas duras de contenção. Faria hoje algo de diferente? 
São Paulo escolheu o lado certo da história, seja nas medidas restritivas, seja na busca incessante da vacina. Passados dois anos, temos como medir isso. Do ponto de vista econômico, foi o estado que mais se recuperou, cresceu cinco vezes mais do que o Brasil. O grande problema da economia sempre foi o vírus, não as medidas que ele nos obrigou a tomar. 

Para muita gente, Doria exagerou no confronto com Bolsonaro nesse período. São Paulo enfrentou o negacionismo preservando a ciência. Agora, com a pandemia controlada, as pessoas querem ter o seu emprego de volta. São Paulo está fazendo a lição de casa, mas precisamos que o Brasil também avance. A população olha para trás e vê claramente que a vacina funcionou. Agora, ela tem outras aspirações. Sou o governador desse momento posterior. 

O governo tem indicadores de gestão muito positivos, mas o seu antecessor sai em campanha com uma rejeição alta. Como explicar esse descompasso? 
A população não está atenta ainda à questão eleitoral. A prioridade do povo é sobreviver, recuperar a vida que tinha, principalmente aqueles que perderam o emprego. Doria fez um governo de muitas realizações, de muitas entregas, e eu não tenho nenhuma dúvida de que ele será reconhecido por isso. Acho que, no momento certo, provavelmente no período eleitoral, isso vai aparecer. 

Há projetos que avançaram bastante, como a despoluição do Rio Pinheiros, e outros que não, como a conclusão do Rodoanel. Quais os pontos fortes e os pontos fracos do governo? 
Eu diria que estamos com o plano de metas em execução. O Rodoanel é a última grande obra parada em São Paulo, e o leilão está agendado agora para abril. Ao lado da proteção social e do emprego, nós vamos ter uma ação ainda mais efetiva na segurança pública. É isso que vejo demandado pela sociedade. A vida voltou ao normal, e os crimes contra o patrimônio voltaram a existir em volume igual ao de 2019. Mas vamos utilizar toda a inteligência policial para continuar tendo os melhores indicadores do Brasil.

Um de seus adversários, Tarcísio de Freitas (Republicanos), candidato do presidente Jair Bolsonaro, tem a segurança pública como bandeira. Na semana passada, citou um “acordo” entre a polícia e o crime organizado em São Paulo. O que achou da crítica? 
Achei que ele falou mais do Rio de Janeiro do que de São Paulo. Confundiu os estados (Freitas é carioca). Pensar na segurança pública é obrigação do governador e é por isso que vou pensar com todo o carinho e dedicação.

Naturalmente, muitos integrantes do governo ficaram incomodados com a referência à dimensão atual do PCC no estado. Isso é uma realidade? 
A realidade é que São Paulo é disparado o estado mais seguro do Brasil. É isso que a população tem de observar. Somos um estado de 46 milhões de habitantes com indicadores de primeiro mundo. Agora, nunca será suficiente. Nunca estará bom, nós queremos melhorar. Temos o estado mais seguro do Brasil em relação a homicídios, crimes contra o patrimônio e furtos. Isso é uma conquista que vem desde Mario Covas. É isso que fica. O resto é especulação. 

Tarcísio é tido como um quadro técnico, eficiente, mas é o candidato do bolsonarismo. O senhor o classifica como um dos extremos a ser combatido? 
Ele representa a família Bolsonaro e está deixando claro isso nas suas narrativas, assim como Fernando Haddad representa o petismo. Eu estou aqui para proteger São Paulo contra o petismo e contra a família Bolsonaro. Não vou governar para os extremos, vou governar para os paulistas.

Há chance de transformar a polarização federal, entre PT e bolsonarismo, em um plebiscito estadual? 
Os extremos políticos não enchem a barriga de ninguém. Estou aqui para mostrar que sou um paulista raiz que quer resolver o problema das pessoas e que essa guerra ideológica não resolveu o problema de nenhum lugar. São Paulo representa a união. Se a gente observar a história do estado, sempre fomos altivos nos momentos em que precisamos ser. Sempre deixamos a polarização de lado. Aqui é o estado do respeito ao contraditório, o estado do trabalho, o estado da compaixão.

Por que esses dois extremos largam na frente nas eleições, segundo as pesquisas? 
É natural que a eleição nacional desperte paixões. A polarização é para todos os estados, mas com o andar do processo, do governo, e no momento da eleição, quando as pessoas pararem para prestar atenção, não tenho dúvida de que a sociedade vai separar a disputa de São Paulo da nacional e fazer uma escolha livre e soberana em relação ao voto.

Qual é o papel do PSDB para quebrar a polarização? 
O PSDB foi o único partido que realizou prévias, em que mais de 40 000 pessoas participaram. Isso deu capilaridade ao partido. E ele escolheu João Doria como candidato. Hoje, ele é o candidato a presidente pelo PSDB, não tem outro. Acredito que a melhor via vai apresentar no momento certo o seu candidato, entre os partidos coligados. E nós estamos muito crentes numa aproximação com o MDB e com o União Brasil. Os três partidos é que vão definir quem será o seu representante. O nome do PSDB é Doria. Se lá na frente identificarem outro, o próprio Doria já anunciou a disposição de apoiar esse nome.

Hoje há figuras como o próprio presidente do partido, Bruno Araújo, relativizando as prévias. Isso não é ruim para a imagem do partido?  

O fundamental é que o PSDB escolheu um candidato, e as prévias devem ser respeitadas. Acredito que Doria pode se viabilizar como candidato a presidente desse grupo de partidos. 

E como é ter agora como adversário o ex-governador Geraldo Alckmin, que foi do PSDB e é uma pessoa com quem o senhor sempre trabalhou? 
Ele é candidato a vice-presidente, não é a governador (risos). 

Na eleição estadual o senhor tem um arco de alianças bem consolidado, com União Brasil, MDB e outros partidos. Como estão as conversas para escolher o vice e o nome da chapa para o Senado?  
A composição deve acontecer muito perto da convenção. Vi vários nomes e fico feliz de algumas figuras terem disposição de compor a minha chapa, mas, na hora certa, com essa grande coligação, compartilhando a decisão, vendo não só aquele que agrega no período eleitoral, mas principalmente o que nós queremos passar de recado para o futuro de São Paulo, é que escolheremos os candidatos a a vice e ao Senado. 

Qual é seu sonho para São Paulo? 
Meu sonho é fazer a educação 100% integral. E que no ensino médio ela seja integrada, que o jovem saia com dois diplomas (ensino regular e profissionalizante). Meu sonho é ter um estado com menos desigualdades, onde as pessoas que querem empreender tenham sua oportunidade, onde aquelas que têm privação social possam caminhar com as próprias pernas. 

Qual é a avaliação que o senhor faz da gestão de Bolsonaro? 
Sou um eleitor frustrado do Bolsonaro. Ele ganhou com uma agenda de reformas e parou na primeira, a da Previdência. Não encarou as outras reformas necessárias para o Brasil, como a administrativa e a tributária. Frustrou a mim e a milhões de brasileiros que acreditaram em um projeto, uma narrativa eleitoral que não se confirmou. Bolsonaro candidato falou uma coisa e, no governo, fez outra.

O senhor se surpreendeu com as ameaças constantes às instituições feitas pelo governo, ou casos como o deboche de Eduardo Bolsonaro em relação à tortura sofrida pela jornalista Míriam Leitão?
 Condenável e lamentável a postura de Eduardo Bolsonaro, mas eu nunca senti que a democracia e as instituições estavam ameaçadas. Sempre confiei na solidez das estruturas institucionais, sempre acreditei na democracia. Ela é maior que qualquer presidente de plantão.

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