Geraldo Alckmin se filia ao PSB em Brasília

Filiação do ex-governador de SP consolida união nacional de PSB e PT, apesar de entraves estaduais entre partidos


O ex-governador Geraldo Alckmin em evento de filiação ao PSB em Brasília 

Julia Chaib, Matheus Teixeira e Carlos Petrocilo - Folha.com

O ex-governador Geraldo Alckmin filiou-se nesta quarta-feira (23) ao PSB após passar mais de 30 anos no PSDB, com a perspectiva de ser candidato a vice do ex-presidente Lula (PT) e afirmou que o petista representa a "esperança".

"Temos que ter os olhos abertos para enxergar, a humildade para entender que ele [Lula] é hoje o que melhor interpreta o sentimento de esperança do povo. Ele representa a própria democracia porque ele é fruto da democracia", disse o ex-tucano.

Além de fazer elogios ao ex-chefe do Executivo, Alckmin também lembrou as disputas eleitorais que teve com o petista.

"Alguns podem estranhar. Eu disputei com o presidente Lula a eleição em 2006 e fomos para o segundo turno, mas nunca colocamos em risco a questão democrática, nunca. O debate era de outro nível, nunca se questionou a democracia".

Na primeira entrevista como filiado ao PSB, o ex-governador de SP disse que o ingresso na sigla socialista representa "mais um passo" na articulação para ser vice de Lula. Apesar disso, afirmou que essas conversas são "partidárias" e que ainda há outras etapas a serem cumpridas até formalizar a chapa que disputará o pleito presidencial.

No discurso logo após assinar a ficha de filiação, Alckmin iniciou saudando os "companheiros e companheiras" e também fez citação específica a integrantes do PT. "Saúdo a presidente [do PT] deputada Gleisi Hoffmann, abraçando todos os deputados, senadores e lideranças do PT", disse.

Alckmin evitou responder ao questionamento sobre as posições econômicas de Lula, que já deu a entender que é a favor da revogação da reforma trabalhista e do teto de gastos, na contramão do que o ex-governador defendeu em 2018, quando foi candidato a presidente.

O novo integrante do PSB citou apenas que a gestão do ex-presidente reduziu a relação entre a dívida pública e o PIB e disso que isso é "um exemplo de responsabilidade fiscal".

O ex-governador paulista migrou ao PSB sem levar políticos de peso ao novo partido, mas com o trunfo de garantir à sigla a cadeira de vice na chapa do ex-presidente Lula (PT).

No discurso, ele lembrou seu histórico no PSDB e mencionou que a "social-democracia e o socialismo têm "origem quase comum".

Ele também citou discurso em que Mário Covas, seu antecessor no governo de São Paulo, disse que, mesmo quando há divergências de ideias, o importante é ter "lealdade com o destino do país".

Alckmin também fez críticas ao presidente Jair Bolsonaro (PL), sem fazer citação nominal ao chefe do Executivo.

"É inacreditável ter, em pleno século 21, negacionismo em vacina, em vacina para criança, logo no país que tem um dos melhores protocolos de imunização do mundo".

O ex-chefe do Executivo paulista foi perguntado sobre como imagina que tem sido o sentimento de seus eleitores históricos, que são mais alinhados à direita, com a aproximação com o PT.

Segundo o ex-governador, ele se manteve quieto nos últimos meses em que estava em negociação a filiação ao PSB e, agora, iniciará um processo de convencimento do eleitorado.

"Fiquei esse tempo todo sem falar, aguardando o momento adequado. Agora é que vamos começar a viajar, conversar, explicar, convencer de maneira respeitosa, mas mostrando a realidade que estamos vivendo e os riscos que o povo brasileiro está correndo", disse.

​Ao celebrar a filiação de Alckmin, o presidente do PSB, Carlos Siqueira, afirmou que o partido precisa estar "à altura dos desafios do Brasil" e fazer a "luta entre a democracia e o arbítrio", em crítica à possibilidade de reeleição de Jair Bolsonaro (PL). "Precisamos alargar o espectro político", afirmou Siqueira.

Alckmin também tem a missão de simbolizar o aceno do petista à centro-direita e ao eleitorado mais refratário à esquerda.

Apesar de a filiação indicar que ele ocupará o posto de vice de Lula, consolidando a união das siglas nacionalmente, há ainda entraves estaduais na aliança entre PSB e PT.

O principal deles diz respeito a São Paulo, uma vez que tanto o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) quanto o ex-governador Márcio França (PSB) pretendem disputar o Palácio dos Bandeirantes.

O presidente do PSB, inclusive, fez questão de citar França e dizer que ele será o "próximo governador de São Paulo".

Há ainda imbróglios no Rio Grande do Sul, Espírito Santo e Paraíba.

Nesta quarta, compareceram à filiação líderes do PSB, como os governadores Paulo Câmara (PE) e Flávio Dino (MA), o ex-governador Rodrigo Rollemberg (DF) e deputados.

Do PT estiveram a presidente do partido, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), e os senadores Rogério Carvalho (SE) e Paulo Rocha (PA), além de deputados federais.

No evento desta quarta, em Brasília, houve outras filiações importantes no PSB, como o vice-governador Carlos Brandão (PSDB), que é apoiado por Dino na disputa ao Governo do Maranhão, e o senador Dario Berger (MDB), que concorrerá ao Governo de Santa Catarina.

No total, foram cerca de 40 novos filiados na ocasião, incluindo também o advogado criminalista Augusto de Arruda Botelho, Carmen Silva, líder do Movimento Sem-Teto do centro de São Paulo, e Toni Reis, presidente da da Aliança Nacional LGBTI+.

Integrantes do PT e do PSB esperam que Alckmin tenha protagonismo na campanha para o Palácio do Planalto e também em um eventual governo, embora seus papéis ainda não estejam totalmente definidos

Em conversas reservadas, Lula tem afirmado querer um vice com quem possa efetivamente dividir a gestão do país.

O ex-presidente menciona nas reuniões com Alckmin a função que o seu ex-vice-presidente José Alencar desempenhava e cita, por exemplo, que ele era figura certa nas reuniões de governo.

O prefeito do Recife, João Campos (PSB), também esteve presente. Ele elogiou Alckmin e afirmou que o ex-governador está "pensando no Brasil" ao se filiar no PSB.

Ao discursar, Gleisi afirmou que é necessário "encerrar o tempo de sofrimento por que passa o povo brasileiro". "Esse campo político que está aqui que tem essa responsabilidade. E é muita responsabilidade que nós temos", disse.

Ela também disse que o ex-presidente Lula havia mandado um "abraço afetuoso" a todos que estavam presentes.

Alckmin comandou o governo paulista entre os anos de 2001 a 2006 e entre os anos 2011 a 2018, por quatro mandatos. Ele assumiu o cargo pela primeira vez devido à morte de Mário Covas, de quem era vice-governador, e no ano seguinte se reelegeu para comandar o estado paulista.

Antes disso, ele já havia sido prefeito e vereador de Pindamonhangaba, deputado estadual e deputado federal.

Ao ser questionado se estava arrependido pelo fato de Alckmin ter deixado o PSDB, o governador de São Paulo e pré-candidato à Presidência, João Doria, disse que era o ex-tucano que deveria estar arrependido por ter abandonado a legendas para se associar a Lula e ao PT, de quem disse querer "total distância".

"Cabe a pergunta, Geraldo Alckmin está arrependido? Depois de ter sido fundador do PSDB, partido que combateu a corrupção de Lula nos 13 anos de lulismo, partido que você criticou inúmeras vezes em debates, manifestação e artigos, e agora você se associa a Lula e aceita fazer parte de uma chapa de vice-presidente com lula", disse.

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